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O Dia Mundial da Conservação da Natureza, instituído pela Organização das Nações Unidas (ONU), é celebrado hoje, 28 de julho, data da fundação da Liga para a Proteção da Natureza.
A Associação Portuguesa de Educação Ambiental (ASPEA) apela a um envolvimento ativo e a uma maior cooperação entre governo, empresas e sociedade civil na defesa e conservação da Natureza. No âmbito das celebrações do Dia Mundial da Conservação da Natureza o Presidente da Associação Portuguesa de Educação Ambiental (ASPEA), Joaquim Ramos Pinto incita a sociedade civil e atores políticos a “ser mais presente no debate e nos processos de tomada de decisão política no que respeita a questões relacionadas com a conservação da Natureza, à escala nacional e global”.
A Associação Portuguesa de Educação Ambiental (ASPEA) assinala a efeméride invocando ser fundamental “o envolvimento de todos os cidadãos na criação de um movimento global contra a perda da biodiversidade, a desertificação acelerada dos solos e o agravamento da crise climática”. Para o presidente da ASPEA, os problemas que afetam a biodiversidade, a conservação da Natureza e o clima mundial exigem respostas políticas capazes de gerar compromissos coletivos no seio das comunidades.
No passado domingo, 13 de fevereiro, foi assinalado o Dia Mundial da Rádio. A designação desta data surgiu em 2011 na sequência da decisão dos estados-membros da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura – UNESCO. No ano seguinte, esta escolha seria validada pela Assembleia Geral das Nações Unidas.
A opção por 13 de fevereiro prende-se com o facto de ter sido neste dia, em 1946, que a Rádio das Nações Unidas emitiu, pela primeira vez, um programa em simultâneo para um grupo de seis países. De anotar que por esse ano ocorriam na Guarda, no interior do Sanatório Sousa Martins, as primeiras experiências de radiodifusão sonora, as quais estiveram na origem da Rádio Altitude (RA).
Evocarmos esta data é, também, exercer o dever de memória para com o pioneirismo da Guarda no campo da radiodifusão sonora; pioneirismo materializado num projeto definido, oficialmente, em 1948 com o início das emissões regulares desta emissora; estação que continua a emitir (agora em frequência modulada e não em onda média, como acontecia à época) a partir da mais alta cidade do país.
É importante que a Guarda, a região e o país não esqueçam esta marca informativa, incontornável quando se evoca a história da rádio em Portugal; até porque estamos a falar de uma emissora que foi uma verdadeira escola de rádio e jornalismo, um espaço de aprendizagem prática, de criatividade, de superação constante dos desafios diários.
A polivalência de funções por que passavam profissionais e colaboradores traduziu-se numa maior capacidade de responder às solicitações do dia a dia da rádio, dos ouvintes, da região. A RA é uma emissora de muitas vozes e rostos, de sonhos, de diferenciados contributos, afetos, ideias, de originalidades, de presença e solidariedade. A sua génese, longevidade, o percurso ímpar e a matriz beirã conferem-lhe, no panorama das rádios portuguesas, um estatuto especial.
Hoje, e falando no geral, as emissões radiofónicas passam, em larga medida, pelo meio digital, num recurso cada vez mais ligado às modernas aplicações e tecnologias. A rádio, a sua forma de estar e responder evoluiu e, felizmente, acaba por estar ainda mais perto, envolvendo o nosso quotidiano; a sua presença pode ser avaliada como plena confirmação de que o meio rádio não pereceu perante o digital e as novas tecnologias. A rádio encontrou novos pilares de sustentabilidade e de maior interação com o seu público.
A generalidade dos equipamentos que usamos diariamente, desde logo o telemóvel, o tablet ou outras expressões da materialização do progresso tecnológico, facilitam-nos e proporcionam o encontro com a rádio, mas para além das emissões em direto não se podem esquecer as vantagens proporcionadas pelo podcast. Neste contexto, para além de evidenciarmos que esta é uma das novas virtualidades a explorar pela rádio, convém aludir à mudança de paradigma do perfil da rádio local.
Contudo, a eminente função social da rádio deve continuar a prevalecer, mesmo face ao desenvolvimento das tecnologias da informação. A pluralidade de novos canais e plataformas de informação criou cenários completamente distintos, onde se torna imprescindível uma atitude de inequívoco profissionalismo, objetivos claros, qualidade de conteúdos, planos adequados e uma atenção permanente aos constantes desafios tecnológicos.
Esgotados muitos dos modelos tradicionais e modificados os graus de atenção e exigência por parte dos ouvintes, torna-se necessário aferir constantemente os projetos e acentuar o espírito criativo, empreendedor. Os desafios da Rádio são imensos; na atualidade não é apenas no plano das ondas hertzianas que tem de ser posicionada a proposta radiofónica: a rádio tem de assegurar uma estratégia rigorosa e clara e assertiva no vasto horizonte da emissão online.
O fortalecimento da sua presença será sustentado, em larga medida, pela atenção à realidade social, económica, cultural e política da região onde a rádio está sediada. As pessoas, para além do entretenimento ou companhia que a rádio lhes proporciona, querem boas condições de audição, uma informação rápida, em cima da hora ou do acontecimento de proximidade; como têm defendido vários investigadores da área dos media, “a força do jornalismo numa emissora de rádio local é o instrumento que lhe dá a sensação de plenitude local e regional”.
Os ouvintes anseiam igualmente por um interlocutor atento, objetivo e credível, uma rádio com gente dentro, de entrega a um serviço público, solidário, afetivo; uma rádio que questione, esclareça, atue pedagogicamente, aponte erros, noticie triunfos, sinta e transmita o pulsar dos territórios, chame a si novos públicos.
Sabemos – por um conjunto de razões, mormente de ordem económica e financeira – que não é um trabalho fácil, mas o êxito constrói-se com competência, perseverança, humildade, diálogo, criatividade e sentido de responsabilidade. Em especial numa época que atravessa ainda a pandemia; esta, como sabemos, implicou profundas e radicais transformações em muitos setores; originou mudanças de estratégias, alterou métodos de trabalho, questionou sobre os caminhos a seguir no futuro. A comunicação social, mormente a rádio, não ficou imune. Daí a necessidade de refletir, objetivamente, sobre as medidas a adotar e igualmente e outrossim sobre os conteúdos programáticos a distinguir ou a criar, pensando no global em não em restritos setores de audiência.
Temos vindo a assistir a uma mudança de opções por parte das pessoas ao nível dos destinos de lazer, dos objetivos pessoais, das condições de segurança sanitária e mesmo dos percursos profissionais. A rádio não pode ficar indiferente a esta nova realidade e deve assumir, também neste plano, o seu importante papel informativo e pedagógico.
A Rádio é memória, que deve exercitar em respeito pelos ouvintes, honrando o compromisso da sua missão, no âmbito do quadro legal estabelecido e salvaguardando sempre os direitos fundamentais.
Lembro que “Rádio e Confiança” foi o tema proposto este ano, pela UNESCO para a comemoração deste Dia Mundial da Rádio; aquela organização da ONU justificou que este meio é um dos mais confiáveis e acessíveis, segundo diversos relatórios internacionais.
O tempo presente continua a ser da rádio! De uma rádio cada vez mais interventiva que saiba ler o presente e construir o futuro; deverá ser também o tempo para uma nova e objetiva atenção às estações de radiodifusão existentes no interior do país.
Muitas das rádios foram perdendo o dinamismo inicial, esbatendo a identidade, afastando-se do quadro legislativo que definiu os seus objetivos, reduzindo-se – em tantos e conhecidos casos – a uma humilde função de retransmissão de outros canais.
É também o tempo de serem apoiadas as estações que, apesar das múltiplas dificuldades continuam “no ar”, sendo apenas lembradas aquando de datas comemorativas, como a que foi assinalada a 13 de fevereiro.
Apoiar estas emissoras é um imperativo moral e ato de justiça, pelo seu papel de serviço público que desenvolvem em prol das populações.
Hélder Sequeira
(in O Interior, 16.fev.2022)
Hoje comemora-se o Dia Mundial da Rádio, este ano tendo como tema o poder da radiodifusão para refletir e promover a diversidade, em todas as suas formas.
Como refere a diretora geral da UNESCO, Audrey Azoullay, sem a rádio o mundo perderia a liberdade e a diversidade cultural.
A data de 13 de fevereiro foi escolhida, recorde-se, pelo facto de ter sido neste dia que a Rádio das Nações Unidas emitiu pela primeira vez, em 1946, um programa em simultâneo para um grupo de seis países.
Declarada esta data, pela UNESCO, em 2011, a primeira vez que se comemorou o Dia Mundial da Rádio foi em 2012.
Desde então, e com propostas temáticas diferentes para se assinalar este dia, a rádio tem sido o meio de comunicação social que atinge as maiores audiências, demonstrando uma notória adaptação às novas tecnologias e comprovando a eficácia da sua intervenção informativa na hora.
Esta capacidade de estar presente é reforçada através das emissões suportadas na web, denotando um crescimento significativo.
O Instituto Politécnico da Guarda (IPG) obteve, recentemente, a aprovação e financiamento dos seis projetos submetidos ao Sistema de Apoio à Investigação Científica e Tecnológica (SAICT) dos quais é líder. O IPG obteve o pleno de candidaturas que a instituição se podia submeter e assegurou a participação em mais nove projetos com instituições de Ensino Politécnico congéneres.
Uma das candidaturas aprovadas relaciona-se com o Projeto MediElderly-Polimedicação do idoso, intervenção educativa para melhorar o uso de medicamento pelos idosos e a disponibilização de informação adequada, incidindo nos Problemas Relacionados com Medicamentos (PRM), quer devido ao uso elevado de medicamento quer devido ao declínio das funções cognitiva e física.
A elevada prevalência de doenças crónicas na população idosa predispõe esta população a um elevado consumo de medicamentos. Em média, os doentes idosos tomam diariamente cerca de 2 a 5 medicamentos prescritos, sendo que, cerca de 20 a 40% dos idosos tomam mais de 5 medicamentos. O elevado consumo de medicamentos está também associado à utilização de medicamentos sem prescrição, frequência de utilização e consumo por períodos superiores à indicação clínica.
O referido Projeto visa o desenvolvimento de uma intervenção educativa focada nos principais problemas relacionados com medicamentos identificados na população alvo constituída pelos idosos da região. Inicialmente será desenvolvido um estudo qualitativo com o objetivo de explorar o conhecimento, experiências e atitudes dos doentes idosos em relação aos seus medicamentos. Será também explorada a perceção dos profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, farmacêuticos e técnicos de farmácia) sobre problemas relacionados com medicamento nos doentes idosos. A segunda fase do projeto consistirá na revisão da terapêutica e num estudo quantitativo para identificação dos principais determinantes de uso inadequado de medicamentos pela população idosa. A informação recolhida durante estas fases será essencial para desenhar uma intervenção educativa junto da população focando soluções para resolver os problemas identificados, e, cujo objetivo final é melhorar o uso de medicamentos pela população idosa com impacto positivo na sua saúde e qualidade de vida.
Com a intervenção educativa, pretende-se melhorar a literacia em saúde dos idosos e seus cuidadores promovendo o seu empoderamento na gestão da sua saúde; de salientar que empoderamento dos doentes é considerado, pela ONU, como um dos pontos-chave para o desenvolvimento sustentável dos sistemas nacionais de saúde.
Fátima Roque (ESS/IPG), investigadora responsável pelo projeto entende que “este estudo responde a um importante desafio societal da região, promovendo a saúde e consequentemente a qualidade de vida da população idosa, contribuindo, também, para uma diminuição de custos em saúde e para uma melhor sustentabilidade dos recursos em saúde através de uma gestão eficaz e racional do uso de medicamentos”.
O antigo Ministro Veiga Simão, e ex-Embaixador nas Nações Unidas, faleceu hoje em Lisboa.
“Sou um Homem que tem as suas raízes na Guarda, as quais alimentam o meu pensamento, até por que, nessas raízes, se encontram os valores maiores da Honra, da Pátria e da Solidariedade...”, disse-nos na entrevista que nos deu em Outubro de 2005, publicada na Revista Praça Velha, editada na Guarda, cidade de onde era natural; entrevista que aqui recordamos.
Na Guarda das referências
Entrevista de:
Helder Sequeira
O guardense José Veiga Simão é uma personalidade cuja craveira académica e científica merece inquestionável reconhecimento, dentro e fora de Portugal.
No plano da sua carreira política registam-se vários cargos de relevo, entre os quais o de Ministro da Educação Nacional (assumindo-se como “intérprete duma Reforma onde os professores foram os meus principais aliados”), Embaixador de Portugal nas Nações Unidas e Ministro da Indústria e Energia. Se a política (“cultivada com princípios”) o não desiludiu, o mesmo já não diz de “alguns políticos”, sobretudo daqueles que “não têm pejo de esconder e ofender a verdade para protegerem interesses pessoais ou partidários ilegítimos”.
Sustenta, entretanto, que “o mérito tem de comandar o progresso...os partidos têm de ser escolas de cidadania e competência e não meras agências de emprego”.
Nascido na Guarda (no Bonfim) em Fevereiro de 1929, Veiga Simão afirma que esta cidade “tem direito a sonhar mais alto”, apontando algumas vias fulcrais para o seu progresso.
Que recordações guarda dos seus primeiros anos, na terra natal?
O meu imaginário, o de quem viveu a sua infância na Guarda, alimenta a minha memória com as mais belas e doces recordações.
Nasci em 1929, no Bonfim, numa casa que já não existe e fui baptizado na Sé da Guarda. Ainda, pela última vez que visitei a Guarda, fui contemplar a pia baptismal, cuja água benta temperou a força granítica, determinante da minha vida.
Mas as minhas recordações centram-se na Rua de S. Vicente, onde vivi até aos dez anos, na Igreja de São Vicente, nos Arcos do Espírito Santo, no Torreão e nos caminhos para a Fonte da Dorna... e, mais fortemente, na Escola Primária velhinha junto ao Tribunal.
Percursos que a minha memória sublimou, conferindo-lhe uma dimensão física que não resistiu à realidade, mas que representa o sonho de criança.
Ainda realizei o exame de admissão no Liceu Afonso de Albuquerque, mas já frequentei o primeiro ano no Liceu D. João III, em 1939, em Coimbra.
Quais as referências humanas e culturais desse tempo?
No percurso que mencionei, salientam-se, como referências maiores, os meus Pais — Aníbal e Maria Joaquina —, o meu irmão único mais velho — Júlio —, a minha professora primária — Dona Aurora —, o meu catequista em S. Vicente — o padre Viegas — mais tarde, pároco inesquecível de Prados, Celorico da Beira, a terra de meus Pais... A minha professora primária, D. Aurora, a professora primeira, acompanha-me, ainda hoje, no meu pensamento sobre Educação... O Verão, com o calor que abrasa e o Inverno, com os seus mantos brancos caídos do azul cinzento dos céus, são imagens que vivem sempre comigo.
Que autores, então, mais o influenciaram?
Não é fácil responder a essa questão, ainda que, no fundo da minha memória, encontre Júlio Verne, Victor Hugo e Camilo Castelo Branco... Outras leituras foram as do “Primeiro de Janeiro” e as que meu Pai me transmitia do seu ídolo — o Presidente da República António José de Almeida —, com fotografia na sala de jantar... A sua visita ao Brasil e a aventura de Gago Coutinho e Sacadura Cabral, eram alimento de “autoestima” dum jovem.
Afirma-se um homem da Guarda? Procura acompanhar a evolução da cidade?
Sou um Homem que tem as suas raízes na Guarda, as quais alimentam o meu pensamento, até por que, nessas raízes, se encontram os valores maiores da Honra, da Pátria e da Solidariedade... Sobre a evolução da minha cidade da Guarda, acompanho-a, apenas, pelos seus jornais, que transmitem sucessos, preocupações, aspirações e angústias... Sinto que a Guarda, como cidade de Portugal e da Europa, tem direito a sonhar mais alto...
Em 1973 foi criada a Escola Normal Superior da Guarda (que acabou por ficar pelas páginas do Diário do Governo). Que importância atribuía a essa Escola, para a cidade e região?
A Escola Normal Superior não foi apenas criada por Decreto-Lei em 1973. A comissão instaladora, constituída por personalidades de rara qualidade, tomou posse em Janeiro de 1974, tendo sido aprovadas as principais orientações estratégicas.
A importância da Escola Normal Superior era evidente, como centro de Educação e de Cultura, com o objectivo primeiro de qualificar professores e de formar técnicos superiores, para áreas decisivas da revolução tecnológica, já em curso, como a informática e as tecnologias de informação, essenciais às empresas e às instituições públicas e privadas.
A sua extinção foi determinada por um conservadorismo esquerdista e quási-anárquico, que prejudicou o progresso da cidade... Perderam-se os doutorandos enviados para a Europa e os EUA, perderam-se as vultosas verbas do IV Plano de Fomento, perdeu-se o acordo, para a sua internacionalização, com uma Grande École francesa e o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian.
A verdade é que a Escola Superior de Educação — e o Ensino Politécnico — só são recuperados passados sete anos, sujeitos a uma configuração determinada por um economicismo circunstancial, sem qualquer base inovadora e prospectiva.
Dessa falta de visão estratégica estamos, aliás, a sofrer as consequências hoje, persistindo em medidas pontuais, desgarradas da questão essencial: Que futuro para a Guarda? Como inseri-la na Europa? Qual o papel do ensino superior da Guarda na Cidade, na Região, no País e na Europa?
Espero que a crise actual aguce o engenho e a ambição dos Guardenses...
A reforma do Sistema Educativo foi a sua preocupação prioritária quando assumiu, em 1970, o cargo de Ministro da Educação. Sente-se – face aos resultados – recompensado pelo trabalho desenvolvido?
A Reforma do Sistema Educativo, que tive a honra e o privilégio de liderar durante quatro anos, entre 1970 e 1974, marcou uma época e representou uma iniciativa ousada de abertura e de evolução do Regime.
Adoptei, como pilar imprescindível, a sua internacionalização e, nesse quadro, mereceu o apoio declarado da OCDE e de países democráticos, em particular, a França, a Inglaterra e os Estados Unidos.
A ala liberal do Regime apoiou, entusiasticamente, a Reforma Educativa. Foi pena não se ter iniciado mais cedo... É que, como nessa altura se proclamava, “um cidadão mais culto é um cidadão mais livre”. Recordo, aqui, apenas as palavras de Sá Carneiro, em 1973:
“Parece-me que, no sector da educação, o Governo se tem revelado efectivamente progressivo. É mesmo, para mim, o único sector em que isso tem acontecido. E é um sector fundamental, pois que o problema da Educação e da Cultura condiciona muito do nosso desenvolvimento, até político. Não creio, de modo algum, que seja o único, ou que seja sequer suficiente para que possamos prescindir, com base nele, de uma liberalização e democratização políticas. Mas creio que, juntamente com elas, é um ponto fundamental de desenvolvimento e, portanto, parece-me que representa um esforço sério e honesto, talvez mesmo o mais sério que até agora se tem efectuado, de conseguir uma autêntica, uma eficaz promoção cultural e educativa dos Portugueses.”
Dir-lhe-ei, ainda, que me orgulho de ter sido Ministro da Educação Nacional, que me orgulho da equipa que colaborou comigo e da qual emergiram personalidades que marcaram a Democracia Portuguesa pela sua capacidade e competência e que sinto uma enorme felicidade por ter sido intérprete duma Reforma onde os professores foram os meus principais aliados.
Essa reforma permitiu, ao país, “acertar o passo pela Europa”?
Essa Reforma, que serviu de exemplo a outros países, deu uma contribuição significativa, para responder criativamente ao desafio, ainda hoje existente, de colocar Portugal entre os países mais atractivos e competitivos da Europa.
Porém, o progresso, indesmentível, dos últimos trinta anos, podia ter sido mais fecundo e visível se não se cometessem erros clamorosos. Citarei, apenas, o desvio de verbas consagradas no IV Plano de Fomento para a educação e que foram suportar as nacionalizações irracionais de empresas com investimentos irrecuperáveis — largos milhares de milhões de euros perdidos — e as fraudes e corrupção que dominaram, em demasia, a aplicação dos subsídios do Fundo Social Europeu na formação dos portugueses...
Hoje, como ontem, perante a crise que quási nos submerge, devemos cultivar o trabalho e a esperança.
O alargamento da escolaridade obrigatória foi uma aposta ganha?
A Lei de Bases do Sistema Educativo de 1973 estabeleceu oito anos para a escolaridade obrigatória. Tinha, ainda, sido decidido que, o nono ano de escolaridade, seria de formação profissional obrigatória, para quem abandonasse o sistema educativo.
Essa aposta não está, ainda, ganha.
E, se nada impede de legislar, no sentido da escolaridade obrigatória ser alargada para doze anos, será também decisivo conferir, de uma vez por todas, ao “ensino tecnológico”, o mesmo status social do “ensino geral”...
Os mecanismos em vigor para o financiamento do ensino tecnológico são de tal modo perversos e discriminatórios, que contrariam frontalmente a continuada e cansativa retórica política dos partidos do poder...
Após o 25 de Abril, como encarou o convite que António de Spínola lhe fez para assumir as funções de Primeiro-Ministro do Governo Provisório?
Com a serenidade de quem sabia não haver condições éticas, nem políticas, para aceitar qualquer lugar de governação. Spínola compreendeu as minhas razões.
Apesar de ter declinado o convite, teve um papel fundamental na redacção do Programa do I Governo Provisório.
Fui eu que concebi e redigi o Programa do I Governo Provisório, a pedido de Spínola, definindo com ele os Capítulos que o integravam. Foi pena não ter sido cumprido.
Em tempo oportuno, revelarei não só as personalidades que trocaram impressões comigo sobre esse Programa mas, também, as diferenças entre o Programa assinado por mim e o que foi publicado no Diário do Governo...
Como analisa, hoje, o período subsequente, em termos pessoais e profissionais?
A maior vitória, nesse período, é, sem dúvida, a consolidação da democracia. A maior derrota, reside no facto de se começar a pensar que a quási única âncora da democracia reside na nossa integração na Europa. De alguma forma, estamos a repetir erros do Estado Novo. Nessa altura, faziam-se comparações — nem sempre legítimas — com a Primeira República, para medir o nosso progresso; hoje fazem-se comparações — nem sempre fundamentadas — com o antes do 25 de Abril...
Temos de mudar de paradigma. A Espanha ultrapassou-nos; países da nossa dimensão, que eram mais atrasados, como a Irlanda e a Finlândia, progrediram, a ritmos que lhes permitiram dar saltos qualitativos. Por isso, sem deixarmos de nos orgulhar do que de bom fizemos, são necessárias atitudes e programas mobilizadores do Estado e da Sociedade Civil.... Temos de compreender as razões para os nossos sacrifícios... Os Governantes e as elites políticas e de gestão das instituições, devem ser exemplares e não constituírem classes de privilégios e de negócios ilegítimos.
O interior tem aqui uma palavra a dizer.... o mérito tem de comandar o progresso... os partidos têm de ser escolas de cidadania e de competência e não meras agências de emprego....
Dos vários cargos que desempenhou, até agora, qual o que lhe deixou melhores recordações: Reitor da Universidade de Lourenço, Marques, Ministro da Educação, Presidente do LNETI, Ministro da Indústria e Energia ou Ministro da Defesa?
Criar uma Universidade em África (1963-1970), que atingiu padrões de excepcional qualidade, em vários domínios do conhecimento, competindo a nível internacional; protagonizar uma Reforma Educativa, sob o lema do direito à educação, do descongelamento da inteligência perdida nos ribeiros do interior e do acesso pelo mérito, foram tarefas inesquecíveis, só possíveis mercê, num caso e noutro, de equipas de excepcional competência e saber e que vieram a ter forte expressão na sociedade democrática pós-Abril.
Criar um Laboratório de Engenharia e Tecnologia Industrial (LNETI), qualificando jovens e dotando-o de instalações e equipamentos modernos, colocando-o como um desejado parceiro europeu dos seus congéneres; e iniciar, no Ministério da Indústria e Energia, uma revolução tecnológica, traduzida num Plano Tecnológico para dez anos, elaborado com o Massachusetts Institute of Technology (MIT) dos EUA e o Banco Mundial, deixaram recordações inolvidáveis.
Criar, fazer e prestar contas, apostando no fortalecimento do capital intelectual português como linha mestre de Obras e de Programas, preencheu em muito a minha vida de professor, de cientista e de político ocasional...
Foi pena que a Universidade em África não tivesse nascido dez anos antes, que a Reforma da Educação não se tivesse iniciado após a II Grande Guerra Mundial... Foi pena que o poder político impusesse uma parálise ao LNETI e que o Plano Tecnológico fosse interrompido por interesses inconfessáveis... Mas, mesmo assim, muito se realizou.
Uma característica comum a todas estas tarefas, foi a sua internacionalização ab initio, com parceiros institucionais da Europa, dos EUA e da OCDE.
Neste percurso, não referirei os tempos inesquecíveis de Embaixador de Portugal nas Nações Unidas...
Finalmente, no que respeita ao Ministério da Defesa Nacional, o processo de modernização das Forças Armadas, por mim iniciado, foi infelizmente bloqueado. Leis em aprovação foram retiradas... prevaleceu a política de que os militares não dão votos... Para que se atingisse tal fim, foi necessário que, na Assembleia da República — conforme as conclusões dum inquérito, realizado pela Procuradoria-Geral da República a uma Comissão Parlamentar de Inquérito — se cometesse, cobarde e anonimamente, um crime de violação de sigilo... Uma vergonha, aliás, internacionalmente conhecida, que fere a honra dos que, na Assembleia da República, exercem o seu cargo com dignidade...
O amor que a Guarda me ensinou a ter pelo Estado, obrigou-me a calar a minha revolta... Um assunto para futuras memórias.
Foi gratificante a experiência como deputado pelo Distrito da Guarda?
Exerci as funções, apenas por breves dias, pois assumi outras funções públicas. Mas, recordo-me das tentativas para se aprovar um Programa gizado para o desenvolvimento do interior.
No entanto, como Ministro da Indústria e Energia, entre outras iniciativas, impulsionei a conhecida barragem do Caldeirão, que fui desenterrar aos arquivos da EDP, apoiei e incentivei a criação do Núcleo Empresarial da Região da Guarda (NERGA), criei um Centro de Desenvolvimento Industrial e apoiei a criação do Parque Industrial...
A política desiludiu-o?
A política é uma arte que, cultivada com princípios, nunca desilude...
Porém, alguns políticos desiludiram-me, designadamente, quando não têm pejo de esconder e ofender a verdade para protegerem interesses pessoais ou partidários ilegítimos.
A mentira e a corrupção invadiram a cidade... Para onde vamos?
Regressando a questões do ensino, qual a principal debilidade do sistema educativo português?
Eleger uma debilidade do sistema educativo como principal causa dos males da educação, é uma forma interessante de provocar saudáveis polémicas.
Por mim, localizarei essa debilidade na fuga a valores que alteram a vida dos jovens, dos professores, das famílias e nos obrigam a repensar a Escola, a apostar em novas metodologias do ensino-aprendizagem, a fortalecer o espaço Escola-Sociedade, a educar os Pais e a apoiar a formação dos professores para a Escola Nova.
Há Universidades a mais em Portugal?
Há instituições e cursos do ensino superior, em número e em qualidade, desajustados da sua missão e funções na sociedade do conhecimento. A sociedade questiona, cada vez mais, o valor científico e social dos diplomas, dos graus e dos títulos...
É urgente avaliar, medir e tomar decisões. Se não fizermos as coisas a tempo, separando o trigo do joio, estamos perdidos na mediocridade.
Que importância atribui ao ensino superior politécnico?
O ensino superior politécnico é uma mais valia do ensino superior português, que não pode nem deve ser perdida. O processo de Bolonha, em Portugal, deve valorizar o ensino politécnico. A sua igualização curricular ao ensino universitário seria um crime idêntico ao que aconteceu com o ensino técnico versus ensino liceal, tendo como resultado, na prática, a extinção do primeiro.
Acha que há o empenho suficiente para se atingir, no nosso país, a qualidade e excelência, ao nível do ensino?
Existem nichos em instituições onde professores e jovens — muitas vezes em estreita ligação com a sociedade — cultivam a ambição da excelência e apostam na qualidade. Aqueles devem ser mais divulgados.
Mas, num sentido genérico, diria que não existe o culto da qualidade. O poder político, em geral, é o expoente máximo dessa inoperância. Bastará dizer que a avaliação da qualidade prevista, em 1986, na Lei de Bases do Sistema Educativo, só deu origem a uma lei regulamentar em 1994, para o ensino superior, e, em 2003, para os outros níveis de ensino.
Como perspectiva o ensino superior da próxima década?
Escrevi, nos últimos anos, em colaboração com outros companheiros, três livros referentes a uma visão estratégica para a próxima década, à oportunidade de Bolonha como ambição para a excelência e a opções estratégicas para a reorganização do ensino superior...
O processo de Bolonha tem de ser conduzido de modo a que as nossas instituições, os nossos cursos, os nossos graus e títulos profissionais, sejam acreditados a nível europeu e avaliados por entidades independentes, com participação internacional... O ensino superior deve ser um instrumento da competitividade de Portugal entre as Nações e uma componente privilegiada das plataformas do conhecimento, onde deve assentar o nosso desenvolvimento sustentado e sustentável.
Neste contexto, que importância atribui à Convenção de Bolonha?
A importância que atribuo à Declaração de Bolonha está explicitada na resposta anterior, sendo necessário, para o êxito do respectivo percurso, que o poder político tome as decisões a que a lei o obriga, as instituições procedam a auto-reformas corajosas e os professores e os alunos adoptem atitudes pró-activas de estudo e engenho.
Há alguns anos atrás, deu a entender a sua intenção em publicar um livro de memórias. Como está esse projecto? A Guarda passa por essas memórias?
Com o distanciar dos tempos e utilizando documentos e testemunhos escritos, como fonte dessas memórias, penso ter chegado a hora de acelerar esse projecto, no qual a Guarda estará presente em diversas épocas....
Que importância atribui à existência, na Guarda, do Centro de Estudos Ibéricos?
Uma importância singular para a afirmação cultural da Guarda e para a projecção dos valores que a definem na Península Ibérica, na Europa e no Mundo... Uma iniciativa que honra os seus obreiros, a Câmara Municipal, a Universidade de Coimbra e a Universidade de Salamanca. Eduardo Lourenço é um patrono inconfundível.
A Guarda tem-se afirmado culturalmente?
Tenho conhecimento, ainda que não aprofundado, de múltiplas iniciativas artísticas e literárias, no domínio da História e das Ciências do Ambiente... que merecem maior visibilidade a nível nacional, ibérico e europeu...
A divulgação dessas iniciativas deve constituir uma prioridade das instituições Guardenses.
Que eixos de desenvolvimento, na sua perspectiva, devem marcar a Guarda do século XXI?
Essa pergunta era uma nova entrevista. Mas, o principal eixo de desenvolvimento, passa por criar condições para a constituição duma “plataforma do conhecimento”, em articulação com a região vizinha da Espanha...
A qualificação humana, em níveis de vanguarda ao serviço de empresas de base tecnológica e cultural, é determinante... A cooperação inter-institucional é, também, decisiva.
Gostaria de estar envolvido num projecto directamente relacionado com o progresso e projecção da Guarda.
Estarei sempre disposto a emitir o meu conselho...., quando me for pedido.
Publicada na Revista Praça Velha, Outubro 2005
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