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A propósito da Prisão Sanatório da Guarda...

por Correio da Guarda, em 18.01.24

 

Os edifícios da antiga Prisão Sanatório e da Cadeia Comarcã, como outros na Guarda, não podem ser dissociados do estudo da evolução citadina na segunda metade do século passado. As referidas estruturas devem ser valorizadas e estudadas face ao papel que desempenharam durante muito tempo; sobretudo a Prisão Sanatório pelo facto de ter sido pioneira em Portugal.

A construção de prisões-sanatório para o internamento dos presos condenados a qualquer pena privativa de liberdade, “que sejam tuberculosos ou predispostos para a tuberculose e necessitem de um tratamento compatível com um regime moderado de prisão” tinha sido já considerada na reforma dos serviços prisionais definida em 1936, através do Decreto-Lei nº 26643, de 28 de maio.

A necessidade de serem criados estabelecimentos prisionais com este perfil ficava sobejamente justificada face aos “graves e visíveis” inconvenientes do internamento de presos com tuberculose “nas prisões comuns”. Por outro lado, e como era referido no mencionado texto legal, “também não parece recomendável o internamento dos presos doentes nos sanatórios ou nas outras instalações destinadas a tuberculosos em geral (…)”; daí que a opção tenha sido pela “criação de uma prisão especial”.

Edifício que, como era sublinhado, foi construído “junto de um sanatório em funcionamento, com o principal intuito de, no interesse do Tesouro Público, aproveitar o material e o pessoal especializado pertencente a esse estabelecimento”.

Era igualmente anotado que a Prisão Sanatório da Guarda tinha “características novas dentro dos serviços penitenciários e que vai funcionar também em novos moldes, através do regime de colaboração a estabelecer com o Instituto de Assistência Nacional aos Tuberculosos”. O Decreto-Lei nº 40231, de 6 de julho de 1955, veio dar “existência jurídica” à Prisão Sanatório da Guarda.

A esta distância temporal, uma alusão ao facto poderá, para alguns, justificar apenas, e com alguma benevolência, um tímido registo de ocorrências do passado. Contudo, importa salientar que a entrada em funcionamento da Prisão Sanatório da Guarda representou mais uma inquestionável afirmação desta cidade – à época – no panorama nacional; isto na sequência de outros importantes serviços ou melhoramentos aqui realizados na primeira metade do século XX.

A escolha da Guarda para a localização desse estabelecimento prisional teve em conta, como já foi dito, a existência do conceituado Sanatório Sousa Martins (inaugurado em maio de 1907) e do seu reputado corpo clínico; aliás foi ele que assegurou o apoio médico e cirúrgico, no âmbito do protocolo estabelecido, então, entre o Ministério da Justiça e a Direção Geral de Assistência. Na Guarda teve lugar, neste contexto, a primeira aplicação prática dessa cooperação; atitude similar foi seguida, mais tarde, na Prisão Hospital S. João de Deus, cuja construção terminou muito tempo depois da inauguração do complexo prisional guardense.

A Prisão Sanatório da Guarda – junto à Cadeia Comarcã, inaugurada na mesma data, 29 de janeiro de 1955 – foi edificada para receber os reclusos, de todo o país, portadores de doenças pulmonares.

Como noticiou a imprensa citadina, a Prisão Sanatório era um “edifício magnífico, ocupando uma área de 1100 metros quadrados. Nas suas enfermarias e nos quartos de isolamento, optimamente mobilados, podem albergar-se mais de cem reclusos”. O Ministro da Justiça, de então, expressou, na altura, o desejo de “que muitos saiam daqui mais sãos no corpo, sobretudo mais sãos na alma”.

Prisão Sanatório - Guarda.jpg Foto de Arquivo_HS

 

No mapa nacional dos serviços prisionais, a mais alta cidade portuguesa ficava dotada, com uma estrutura ímpar, enquadrada na propalada “revolução no espírito e na orgânica”, fomentada e defendida pelos dirigentes políticos da época.

Por outro lado, ao serem viabilizadas novas instalações para a Cadeia Comarcã da Guarda libertou-se o centro da cidade do “espectáculo desagradável”, numa expressão da imprensa local, decorrente da permanência e do contacto com os presos, e asseguraram-se – pelo menos era essa a intenção oficialmente manifestada – novas condições para a desejada regeneração dos reclusos.

As duas prisões (e edifícios anexos para os guardas e serviços de apoio) representaram um investimento de cerca de 5 000 contos, verba muito significativa nos tempos (igualmente difíceis no plano financeiro), que decorriam.

A partir de 1971 passou a funcionar nas instalações da Prisão Sanatório o Estabelecimento Prisional Regional da Guarda, até porque “a evolução entretanto verificada nos métodos de tratamento da tuberculose determinou o encerramento daquela unidade prisional”, como era evocado no Decreto-Lei nº 359/85 de 3 de setembro que decretou a extinção da Prisão Sanatório da Guarda.

Apesar das sucessivas alterações, a matriz da Prisão Sanatório da Guarda permanece naquela estrutura que ladeia o atual Parque da Saúde, constituindo um património guardense em relação ao qual temos o dever da memória…

 

Hélder Sequeira

 

in O Interior_17jan2024

 

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publicado às 22:30

A propósito de uma expedição...

por Correio da Guarda, em 23.09.21

 

Numa organização conjunta da Câmara Municipal de Seia/ Centro da Interpretação da Serra da Estrela, do História, Territórios, Comunidades - CFE NOVA FCSH e da Sociedade de Geografia de Lisboa foi evocada, na passada semana, a Expedição Científica à Serra da Estrela realizada em agosto de 1881.

A propósito desta iniciativa, foi comentado pela organização que Expedição Científica de 1881 “é o resultado de um esforço coletivo de homens do saber, num território amplamente vasto e desconhecido, todavia, em 15 dias de trabalho árduo, foi possível completar um estudo científico que marcaria a história e a mais completa erudição científico-laboratorial, cartográfica, fotográfica e bibliográfica sobre a serra da Estrela”.

O programa do Congresso sobre a Expedição Científica à Serra da Estrela englobou, para além das comunicações apresentadas nos diferentes painéis, uma atividade no Parque da Saúde da Guarda que constituiu um oportuno momento para (re)visitar o antigo Sanatório a que foi atribuído o nome do médico Sousa Martins.

Visita ao Sanatório - HS.jpg

O nome deste clínico está indelevelmente ligado à história da luta contra a tuberculose, em Portugal; de recordar que Sousa Martins, num relatório datado de 1880, fez a caracterização da tuberculose, nessa época, acentuando a importância da criação de sanatórios na zona da Serra da Estrela; em 1881 este integrou a Expedição Científica à Serra da Estrela, promovida pela Sociedade de Geografia de Lisboa Dessa iniciativa resultou a elaboração de relatórios das várias secções científicas, que aparecem compilados num volume intitulado “Expedição Científica à Serra da Estrela” e, dois anos depois, o livro “Quatro Dias na Serra da Estrela”, da autoria de Emídio Navarro.

Essa expedição teve o mérito (e sobretudo através da determinação de Sousa Martins), entre outras relevantes resultados, de chamar a atenção dos meios científicos e clínicos para as condições que a região oferecia no tratamento da tuberculose.

Sousa Martins defendeu a criação de Casas de Saúde nesta zona, impulsionando a fundação, em 1888, do “Club Herminio”, uma associação de carácter humanitário que se manteve durante cerca de quatro anos. Ainda em 1888, e correspondendo aos argumentos de Sousa Martins e de Guilherme Teles de Meneses, o médico Basílio Freire, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, instalou-se na Serra da Estrela, no verão desse ano, onde assegurou consultas gratuitas aos doentes que o procuravam.

Os esforços que Sousa Martins desenvolveu, fortalecidos pelas suas esclarecidas convicções, em muito contribuíram para a construção do Sanatório (inaugurado em 18 de maio de 1907).

O congresso agora realizado, e que justamente assinalou a Expedição Científica de 1881, “permitiu revelar alguns dos segredos da mais alta montanha do território continental, dando a conhecer a Serra nas suas dimensões geográficas, climáticas, orográficas, antropológicas, etnográficas, arqueológicas e médicas”, como foi sublinhado pela organização.

Sananório - pavilhão RDA - HS.jpg

Por outro lado, a atividade (no âmbito desse congresso) que no passado domingo foi desenvolvida no espaço anteriormente do antigo Sanatório da Guarda – onde se encontram os emblemáticos pavilhões num estado de progressiva degradação a caminho da ruína total – foi mais uma chamada de atenção para o valor patrimonial ali existente.

Pavilhão - pombas HS.jpg

E não falamos apenas dos edifícios da antiga estrutura sanatorial, da sua arquitetura, da sua história, dos materiais utilizados na sua construção, mas também das múltiplas espécies florestais ali existentes, das especificidades geológicas, de aves que ali estão referenciadas (algumas como raras no contexto nacional). Este é um espaço de incentivo ao estudo e à descoberta, num entusiasmante e ímpar contexto interdisciplinar.

Sequoia - HS.jpg

Aliás, será com um enquadramento de contributos diversificados que pode ser conseguida uma real salvaguarda e divulgação de uma riqueza patrimonial da Guarda, alheada (apesar de alguns esforços e individuais ao longo de décadas) do potencial de um espaço – voltamos a enfatizar – de reconhecido valor e centralidade.

Sanatório - Ponte HS.jpg

Um espaço que tem passado à margem de campanhas e debates, porque, lamentavelmente, é mais importante agitar outras bandeiras, em consonância com os interesses de calendários pessoais, políticos ou eleitorais…

É mais do que tempo da salvaGuarda e valorização destes territórios de história, cultura, lazer e afetos. Assim haja vontade e determinação para lançar projetos sólidos, abrangentes e de verdadeiro interesse para a comunidade, sem ostracizar contributos idóneos.

 

                                                                                                                           Helder Sequeira

 

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publicado às 12:45

Ladislau Patrício evocado no Congresso da SPP

por Correio da Guarda, em 14.11.20

 

Ladislau Patrício, o médico guardense que foi o terceiro diretor do Sanatório Sousa Martins, foi hoje evocado no 36º Congresso da Sociedade Portuguesa de Pneumologia (SPP), a decorrer desde quinta-feira em Albufeira.

No painel dedicado ao tema “A Pneumologia ao longo da História”, Hélder Sequeira apresentou uma comunicação subordinada ao tema “Ladislau Patrício: pioneiro da especialidade de pneumotisiologia em Portugal”.

Congresso da Sociedade Portuguesa de Pneumologia .

Num contexto particularmente difícil, tal como o que foi registado nas primeiras décadas do século passado, o conferencista sublinhou as palavras do próprio Ladislau Patrício, quando observava que “(…) nenhuma vida se presta talvez como a de médico para revelar o valor moral do homem, porque não há outra de certo em que uma alma bem formada encontre mais ocasiões e pretextos para fazer o bem.”

Depois de aludir à sua biografia e à atividade na Guarda, em particular no Sanatório Sousa Martins – onde foi também um visionário do papel da comunicação em saúde e da importância da radiodifusão sonora, materializada nas emissões da Rádio Altitude – concluiu que Ladislau Patrício “deve ser recordado e estudado, enquanto médico, paladino da luta contra a tuberculose, pioneiro da especialidade de pneumotisiologia, como escritor e como cidadão.”

Ladislau Fernando Patrício nasceu na Guarda, a 7 de dezembro de 1883, e faleceu em Lisboa a 24 de dezembro de 1967. Com a implantação da República, este clínico teve uma fugaz passagem pela vida política; em 1910 aparece como Vice-Presidente da Comissão Executiva do Centro Republicano da Guarda e em 1911 esteve à frente dos destinos do município guardense.

Em 1922, a convite do médico Amândio Paul, passou a trabalhar (como subdiretor) no Sanatório Sousa Martins, dirigido nessa época por aquele clínico, a quem viria a suceder, em 1932; nessas funções permaneceu até 7 de dezembro de 1953.

Na sequência de uma proposta do médico guardense foi criada, no âmbito da Ordem dos Médicos, a especialidade de Tisiologia,

“Ladislau Patrício – como foi referido nessa comunicação -  é um dos nomes consagrados na galeria de médicos-escritores, tendo manifestado bem cedo a sua faceta de homem de cultura. No Sanatório Sousa Martins apoiou projetos com indiscutível alcance cultural e social; veja-se o caso do jornal “Bola de Neve” e da Rádio Altitude”. O “Bacilo de Kock e o Homem” é uma das suas obras, de cariz científico mais divulgadas, sendo “Altitude: o espírito na Medicina” outro dos mais significativos trabalhos de Ladislau Patrício.

 

 

 

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publicado às 23:53


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