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A falta de participação efetiva e de transparência do processo de elaboração do Programa de Revitalização do Parque Natural da Serra da Estrela foi denunciada, em carta aberta, por 28 associações cívicas e ambientais. O Movimento Associativo da Serra da Estrela questiona assim o Governo sobre o Programa de Revitalização do Parque Natural da Serra da Estrela.
Recorde-se que na sequência da Resolução do Conselho de Ministros de 8 de fevereiro, foi anunciado um investimento total de 155 milhões de euros no âmbito do Programa de Revitalização do Parque Natural da Serra da Estrela (PRPNSE).
As associações do território solicitaram o acesso ao Programa aprovado e denunciam várias falhas no seu processo de elaboração, sublinhando que “o instrumento tinha sido anunciado pela Ministra Ana Abrunhosa, como um plano que partisse do território, envolvendo as entidades e populações locais, o que acabou por não acontecer.”
Assim, 28 associações da Serra da Estrela e de âmbito nacional uniram-se “para partilhar preocupações e formular exigências relativamente ao que foi anunciado pelo Governo e pelos Municípios da Guarda e da Covilhã.” Como foi referido, “do seu conhecimento do terreno e do historial da gestão do Parque Natural, ressalta a indignação com a falta de modelos de participação, a falta de transparência e uma tendência para uma aposta que foca o investimento público na Serra da Estrela em projetos avulsos em vez de desenhar um plano resiliente, partindo de uma visão de longo prazo.”
Manuel Franco, presidente da Associação Guardiões da Serra da Estrela criada após os incêndios de 2017, considera que “houve uma auscultação inicial para a qual algumas associações foram convidadas de forma aleatória, mas não foi um processo abrangente nem suficientemente participado.”
A este propósito acrescentou que foram “confrontados com um comunicado que fala em grandes obras sem uma palavra dirigida à conservação ou resiliência, completamente desligado das verdadeiras origens das catástrofes cíclicas que assolam este parque natural.” Na referida carta aberta, as associações acrescentam que a “falta de transparência manifesta na definição e aprovação do PRPNSE impossibilitou a sua avaliação e discussão pública atempada, isto é, enquanto era possível colaborar na elaboração de uma estratégia conjunta para a Serra da Estrela.”
Os autores da carta aberta partilham o “receio de que o Programa não esteja realmente centrado na urgência de revitalização da paisagem destruída pelos incêndios, uma vez que a maior parte de possíveis projetos entretanto comunicados” pelo Ministério e pelos Municípios focam em grandes obras e infraestruturas, há muito reclamadas pelos poderes locais.
Na perspetiva dos signatários, “este programa deveria ter como principal preocupação a sustentação e regeneração de um território de conservação e de prestação de serviços de ecossistema, nomeadamente ao nível da água e dos solos, do carbono e da própria biodiversidade.”
Joana Viveiro, do Movimento Estrela Viva, criado também em seguimento da calamidade de 2017, afirmou que “as associações da Serra da Estrela depositavam neste ‘Plano Marshall’ para a Serra da Estrela, alguma esperança. Mas o processo começou mal, com a falta de envolvimento efetivo da sociedade civil e a pouca transparência na elaboração do documento, que não foi alvo de qualquer consulta pública. Para além disso, este programa deveria ter como principal preocupação a regeneração de um território de conservação e a remuneração justa pelos serviços de ecossistema, e parece-nos que não será bem essa a prioridade.’’
Essas preocupações comuns e a vontade de contribuir para uma regeneração efetiva da maior área protegida do país, levaram os signatários a solicitar uma audiência, com carácter urgente, ao Ministério da Coesão Territorial e à CIM-BSE.
Assinam esta carta aberta A Geradora - Cooperativa Integral, CRL; Acréscimo - Associação de Promoção ao Investimento Florestal;
Associação ALDEIA / CERVAS - Centro de Ecologia e Recuperação e Vigilância de Animais Selvagens; Associação Guardiões da Serra da Estrela; Associação Veredas da Estrela; Campo Aberto - associação de defesa do ambiente; CIDAMB - Associação Nacional para a Cidadania Ambiental; Coletivo à escuta; Ecoativo - Associação de Protecção e Conservação da Natureza; FAPAS - Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade; FOLGONATUR - Associação Sem Fins Lucrativos; GEOTA - Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente; GO Romaria - Associação Cultural Gouveense; Grupo Lobo - Associação para a Conservação do Lobo e do seu Ecossistema; IRIS - Associação Nacional de Ambiente; LPN - Liga para a Protecção da Natureza; Milvoz - Associação de Protecção e Conservação da Natureza; Movimento Estrela Viva - Associação Cívica pelo Desenvolvimento Sustentável e Integrado da Serra da Estrela; Núcleo Regional da Guarda - Quercus A.N.C.N.; Palombar - Associação de Conservação da Natureza e do Património Rural; ProTejo - Movimento Pelo Tejo; QUERCUS- A.N.C.N. - Associação Nacional de Conservação da Natureza; Rewilding Portugal; SPBotânica - Sociedade Portuguesa de Botânica; SPEN - Sociedade Portuguesa de Entomologia; Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA); URZE - Associação Florestal da Encosta da Serra da Estrela e ZERO - Associação Sistema Terrestre Sustentável.
A chuva intensa que caiu na passada semana provocou, como é do conhecimento público, elevados prejuízos na freguesia de Sameiro (Manteigas).
A força das águas danificou habitações, destruiu telhados, arrastou viaturas, derrubou postes de iluminação pública, provocou inúmeros e elevados prejuízos.
Era, aliás, previsível a ocorrência deste tipo de situações face à tragédia que se abateu sobre a Serra da Estrela. Na nossa memória devem continuar presentes as imagens das labaredas que destruíram histórias de vida e trabalho árduo, dizimaram espécies animais e vegetais, transformaram a cor da esperança num crepitante manto negro onde ficaram comoventes súplicas de troncos carbonizados, quais esculturas de terror e morte…e muitos desses troncos de árvores irremediavelmente feridas foram agora lançados na fúria da água e da lama…
Sobre o fogo que lavrou na Estrela há múltiplas questões que têm de ser equacionadas, esclarecidas, resolvidas com decisões firmes, sem subalternizações geográficas ou em função do peso dos indicadores demográficos na definição do quadro político.
Somos todos Portugal e a Serra da Estrela, o interior recusa a ser tratado como até acontecido até aqui, pesem argumentos (sobretudo eleitoralistas) em sentido contrário. Não podemos continuar a ser, “socialmente, uma coletividade pacífica de revoltados” (na elucidativa expressão de Torga) e a merecer atenção apenas em dias de tragédia ou de lamentáveis episódios.
Passados que foram os dias de desespero, anunciadas as intenções governamentais de tornar a Serra da Estrela “melhor do que estava,” declarada e definida a situação de calamidade pública, feito o balanço dos prejuízos, identificados os casos onde deve haver um apoio urgente, anunciadas as verbas a aplicar, importa passar das palavras aos atos. Há que desencadear medidas que não pactuem com o tradicional esquecimento e comodismo, ou fiquem enredadas na sobreposição de esferas de competências institucionais, com as consequentes demoras nas decisões específicas. Em especial as relativas aos auxílios e apoios a quantos viram dizimados os seus haveres e meios de subsistência.
Neste contexto, é justa uma referência às associações e aos voluntários que imediatamente estiveram no terreno serrano e foram ao encontro das pessoas, sobretudo mais idosas e fragilizadas.
Esta solidariedade deve ser enaltecida e servir de desafio a todos quantos sentem e vivem a Estrela que nos guia; onde deve ser célere a planificação, escolha cuidada de espécies autóctones e pronta reflorestação.
Escrevia João de Araújo Correia que “(…) o melhor remédio curativo e preventivo contra a corrupção do ar é o arvoredo. Onde houver uma árvore, há uma fonte que lava o sangue do homem. Quero até crer que lhe lava a alma como transcendente espelho de beleza. Hoje, que a alma comum se deixou inquinar, só à vista da árvore se pode desencardir (…)”. E só com novas árvores retiraremos o manto de luto que continua estendido por uma larga área da Serra.
A dimensão e as consequências do fogo que deflagrou num Parque Natural, numa zona classificada como geoparque mundial da UNESCO (a merecer mais informação e sinalética) não podem ser esquecidas pelas entidades governamentais e autárquicas, a quem se deve exigir atuação preventiva, firme e eficaz no quadro das suas competências.
A Serra da Estrela “em cujo seio de pedra palpita o amorável coração de Portugal” (Ladislau Patrício) pode e deve ser um símbolo de unidade de esforços, competências, recursos e ideias, alargado a todo o território nacional em prol de um harmonioso e equilibrado desenvolvimento.
Entretanto, a Estrela continua majestosa, convidativa à (re)descoberta em qualquer época do ano e suscitando um vasto conjunto de percursos e propostas ao longo dos territórios que a têm como guia perene.
Helder Sequeira
in O Interior, 21| Set | 2022
Ao escrevermos estas palavras [já na noite de segunda-feira] não conhecemos ainda o cenário resultante dos fogos que estão a atingir Gonçalo, Seixo Amarelo, Famalicão da Serra, Vale de Amoreira, Valhelhas, Colmeal da Torre e outras zonas circunvizinhas, mas adivinha-se trágico e desolador…
Com estes novos incêndios [já depois de enviado o texto para publicação foi registado mais um incêndio no concelho de Gouveia] e reacendimentos é, infelizmente, ampliada a mancha negra que tem ferido a Serra da Estrela há mais de uma semana; realidade que se traduz em graves consequências para a economia local e regional, para um elevado número de pessoas, para o património florestal e ambiental, para a biodiversidade…
O interior ficou, inquestionavelmente mais pobre e débil com este golpe violento do fogo impiedoso numa Serra “alta, imensa, enigmática” cuja “presença física é logo uma obsessão”, como escreveu Miguel Torga.
A Estrela, contudo, “não divide, concentra”, dizia ainda o poeta. Nestes fatídicos dias a Serra voltou a concentrar os esforços de centenas de bombeiros e outros operacionais (de instituições e serviços diversos) que merecem o nosso elevado respeito e gratidão por tudo quanto têm feito em prol da defesa de pessoas, bens, animais, floresta; travando uma luta difícil, em condições inimagináveis para muitos.
Sobretudo para aqueles que, em especial no comodismo e anonimato proporcionado pelas redes sociais, criticam, elaboram teorias, emitem opiniões que roçam o ridículo, deturpam realidades, enquadram as suas expressões numa atitude maldizente e tendenciosa…perante a situação que estamos a viver é fundamental uma postura cívica e colaborante, o apoio os homens e mulheres que estão no terreno, perante as chamas, o perigo constante.
E por vezes há gestos simples que traduzem o apreço e admiração por aqueles que envergam a farda dos bombeiros, da GNR, das forças especiais, sapadores, etc. Assim, não poderíamos deixar de transcrever as palavras que um bombeiro de Almada – que esteve aqui na Serra da Estrela a combate – escreveu numa rede social (as redes sociais também têm, obviamente, virtualidades quando utilizadas com responsabilidade e bom senso).
“Olá Criança: Desculpa tratar-te assim , mas não sei como te chamas [soube-se depois tratar-se de um menino chamado Gonçalo], nem tive oportunidade de falar contigo, sou o Chefe da equipa do veículo dos Bombeiros de Almada que passou por ti perto do Vale de Amoreira (…), tínhamos tido umas horas de combate complicado estávamos cansados, mas passámos na estrada junto ao café onde estavas com os teus familiares, de repente voltaste - te para nós e bateste-nos continência; na altura e porque havia trabalho a fazer, respondemos apenas com o toque da buzina de ar, mas o teu gesto aliviou o nosso cansaço e deu-nos ânimo. Dizem que as crianças são puras e que não enganam, como eu gostaria que os adultos fossem assim. Pelo ânimo dado a esta equipa com o teu gesto e como Chefe da mesma, retribuo o gesto dizendo-te em nosso nome: Muito Obrigado.”
Passados que forem estes dias de tragédia certamente serão conhecidas muitas outras expressivas atitudes de agradecimento para quem tem estado, dias e dias seguidos, no teatro de operações; ou mesmo para realçar exemplos de coragem.
No local do Covão da Abelha (zona da Serra de Baixo), Parque Natural da Serra da Estrela elementos da GNR resgataram um cidadão ameaçado pelas chamas. O próprio fez o relato, num agradecimento que dirigiu ao Comandante do Posto da Guarda Nacional Republicana de Manteigas (e posteriormente divulgado pelo Comando Territorial da Guarda): “salvaram a minha vida, com a sua rápida e decisiva entrada na zona já circunscrita em chamas. Este facto verificou-se após inesperado e violento reacendimento, com acelerada progressão das chamas, provocado por fortíssima e permanente intensidade de vento na zona onde me encontrava. Em local de difícil acesso em montanha (1300 metros), irromperam na sua viatura para o meu resgate, em tempo de sair da zona onde o fogo progrediu em forma de tenaz. Esta ação demonstra, a meu ver, ato heroico de bravura, de excecional abnegação e valentia, com comprovado perigo da sua vida (…)”.
Haverá tempo para serem conhecidos outros atos como este, a par da resposta que algumas associações e grupos de cidadãos deram de imediato ao nível do apoio a pastores e agricultores que foram atingidos fortemente pela onda devastadora dos fogos. E há que sublinhar o papel ativo das gentes locais na ajuda ao combate às chamas, quer com intervenção direta, quer com a orientação no terreno cujo conhecimento dominam.
Haverá tempo para se perceber o que falhou no combate inicial ao fogo na Serra (não sendo especialista na matéria, parece-me haver um consenso de que a situação não terá sido devidamente avaliada no que concerne à provável evolução das chamas e aos meios terrestres e aéreos necessários a uma resposta mais musculada), que dificuldades houve ao nível da coordenação e comunicações, na logística de apoio às corporações de bombeiros, etc…
Contudo não há tempo a perder na implementação dos apoios necessários a quem perdeu bens e sustento, no desenvolvimento das necessárias ações tendentes a neutralizar as falhas verificadas, na aplicação das medidas conducentes a uma rápida revitalização deste território, no rigoroso planeamento da reflorestação. São precisas decisões e atos e não mera retórica mediática.
Enquanto isso, evidenciamos, de novo, o respeito e gratidão para com todos os operacionais, agentes e corporações que têm estado na linha da frente no combate ao fogo.
Hélder Sequeira
In "O Interior", 17 de agosto 2022
Incêndio ativo e áreas queimadas (até esta hora) no espaço do Parque Natural da Serra da Estrela.
Fonte: Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais (EFFIS)
Fonte: Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais (EFFIS)
Continua ativo na Serra da Estrela o fogo que começou na madrugada do passado sábado em Garrocho (Covilhã) e que se estendeu aos municípios de Manteigas, Guarda e Gouveia. Foram registados, até ao momento 11 feridos ligeiros, tendo ardido uma área de cerca de 10 mil hectares até ontem (um valor dado ainda como provisório). No terreno estão perto de 1500 operacionais e perto de 470 veículos.
Até agora ardeu uma parte significativa do Parque Natural da Serra da Estrela. Recorde-se que fez no passado dia 10 de julho dois anos que a UNESCO reconheceu a Serra da Estrela como Geopark Mundial.
Zona Protegida na área da Serra da Estrela | Fonte: Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais (EFFIS)
Incêndio ativo e áreas queimadas. Fonte: Sistema Europeu de Informação sobre Incêndios Florestais (EFFIS)
Para além das pesadas consequências em termos económicos, paisagísticos, patrimoniais e ambientais o fogo provocou já “um dano enorme na biodiversidade da Serra da Estrela” como sublinhou José Conde, biólogo do Centro Interpretação da Serra da Estrela (CISE).
Na tarde de hoje as chamas evoluíram, entre outras frentes, em direção à aldeia histórica de Linhares da Beira, ameaçando também Freixo da Serra e Figueiró da Serra, no concelho de Gouveia. (em atualização).
A onda de incêndios que está a assolar o país deixa atrás de si um cenário de guerra e tragédia, mas também de heroicidade e abnegação, num protagonismo assumido pelos nossos soldados da paz. A quem devemos gratidão, respeito, solidariedade permanente, e não apenas nos momentos difíceis. Este quadro negro que tem alastrado nas paisagens beirãs, e mesmo às portas da cidade mais alta (como aconteceu nesta segunda-feira) leva-nos a evocar uma página triste da nossa história.
No próximo domingo, 24 de julho, o ocorre a passagem do 212º aniversário da Batalha do Côa um dos combates mais violentos da terceira invasão francesa. Nesse dia, em 1810, no Cabeço Negro (Almeida, junto às margens do rio), as tropas anglo-lusas lutaram abnegadamente contra as forças do exército francês do Marechal Michel Ney (1.º Duque de Elchingen); uma batalha que antecedeu a queda da fortaleza de Almeida e a sua ocupação pelas tropas entradas em Portugal sob o comando do Marechal André Massena.
Este foi o primeiro combate travado no contexto da terceira invasão francesa que colocou frente a frente as forças militares portuguesas e inglesas, comandadas pelo Brigadeiro-General Robert Craufurd (1764-1812), com o 6º Corpo do exército francês que se deteve na margem leste do rio Côa com o objetivo de cercar a praça-forte de Almeida. Após a conquista de Ciudad Rodrigo (Espanha), em 10 de Junho de 1810, pelas tropas francesas o objetivo do exército invasor era o domínio da praça portuguesa, que teria cerca de 2000 habitantes e estava guarnecida com 5 000 soldados e 115 peças de artilharia.
Com a aproximação das forças francesas, o comando do exército anglo-luso apelou aos habitantes para abandonarem as suas casas e levarem os seus haveres. Nos primeiros dias de agosto de 1810 o Marechal Massena mandou avançar o Oitavo Corpo do exército francês, sob o comando de Jean-Andoche Junot, dando início ao cerco de Almeida, a 10 de agosto, cuja guarnição militar era chefiada pelo coronel inglês Guilherme Cox, sendo Tenente-Rei o almeidense Francisco Bernardo da Costa.
O cerco decorria há 17 dias quando, ao cair da noite, uma granada francesa provocou uma explosão em cadeia que destruiu o paiol principal, onde estavam armazenadas 75 toneladas de pólvora; centenas de mortos e enormes danos no interior da fortaleza foi o balanço imediato da tragédia.
Na manhã seguinte, 27 de agosto de 1810, o Marechal Massena exigiu do comandante inglês a rendição imediata da praça, o que acabou por suceder nessa noite.
A importância desta fortaleza era há muito conhecida; após o primeiro de dezembro de 1640, o rei D. João IV ordenou a sua reparação, face aos momentos e às difíceis contendas que se avizinhavam. Desde logo ficou percetível o papel preponderante que Almeida ia ter no processo bélico de manutenção da independência. A vila foi transformada em sede do quartel-general do Governador de Armas da Beira, constituindo-se na mais importante praça do reino português.
Álvaro de Abranches, um dos conjurados da Revolução de 1640 e membro do Conselho de Guerra de D. João IV, foi o primeiro Governador de Armas de Almeida, empenhando-se, de imediato no seu eficaz guarnecimento, rentabilizado o sistema de fortificações de que estava dotada.
Ao evocarmos esta efeméride, e para além importância histórica do ato associado que constitui uma página da nossa História, gostaríamos de sublinhar a importância que assume um mais amplo conhecimento da região – num quadro articulado de estudo interdisciplinar – que propicie a sua valorização e aproveitamento das suas potencialidades em várias vertentes, desde logo no plano do turismo cultural; igualmente ao nível do património paisagístico e ambiental, tão fortemente atingido, nas últimas décadas, pela catástrofe dos incêndios.
Uma efeméride que nos leva a um território onde o Côa vai vencendo obstáculos antes de chegar ao seu destino; rio de encantos vários, o Côa (um dos poucos a correr de sul para norte) é um guardião milenar de espólios arqueológicos e históricos, que bem merece uma maior atenção.
Seguir o seu percurso é como viajar através de algumas páginas da nossa memória coletiva e reencontrar expressivos testemunhos do passado, com diversificadas marcas humanas que moldaram o perfil destas terras. Recordemos que até 1297 o Côa foi o limite da fronteira entre os territórios dos reinos de Portugal e Castela; com a assinatura do Tratado de Alcanices, por D. Fernando de Castela e D. Dinis de Portugal, o castelo de Almeida – entre outras fortalezas – passou para o domínio da coroa portuguesa; esta zona teve uma grande importância estratégica, do ponto de vista militar; aqui se travaram, ao longo dos séculos, várias batalhas.
Como foi o caso da que ocorreu a 24 de julho de 1810, relembrada nestas despretensiosas notas.
É importante que a união dos portugueses não seja apenas em função de acontecimentos isolados (mais ou menos mediatizados) ou conjunturais, mas em torno do conhecimento e respeito pela História...com uma intervenção cívica e solidária constantes…
Hélder Sequeira
In O Interior, 20/7/2022
A Associação de Municípios da Cova da Beira (AMCB) vai promover um curso de Especialização em Fogo Controlado, reconhecido pelo ICNF, para os técnicos das autarquias dos municípios associados.
As intervenções de fogo controlado no território enquadram-se num planeamento local/ municipal e têm como objetivos principais reduzir a carga de combustível existente e criar descontinuidades na vegetação, aumentando desta forma a resiliência do território à propagação de incêndios rurais. Simultaneamente, é dada resposta às necessidades dos agentes locais, nomeadamente baldios, pastores e caçadores, resultando assim em ações de prevenção de incêndios rurais de forma integrada.
Esta formação, de acordo com a AMCB, insere-se no objetivo específico de aumentar a resiliência territorial para os riscos naturais e transfronteiriços e será realizada através do projeto BIOFRONTERA II – Cooperação Transfronteiriça Portugal-Espanha, que visa melhorar a Gestão dos Recursos Naturais através da Promoção da Adaptação às Alterações Climáticas, Prevenção e Gestão de Riscos.
Os destinatários são os detentores de formação de nível 6 ou superior, de acordo com o Quadro Nacional de Qualificações (QNQ) com formação nas áreas de proteção e defesa da floresta, silvicultura, ciências agrárias, ciências do ambiente ou ecologia.
As sessões teóricas serão à distância e as sessões de campo realizadas em áreas com plano de fogo controlado, nomeadamente em povoamentos de pinheiro bravo e renovação de pastagens.
Os interessados podem obter mais informação aqui.
A cidade da Guarda continuou hoje sob intenso manto de fumo originado, sobretudo, pelo incêndio que começou ontem, pelas 13h44, em Fernão Joanes e que progrediu para as zonas de Seixo Amarelo, Vela, Aldeia do Bispo e Vale de Estrela.
Hoje, durante a tarde, a Estrada Nacional 18 (EN 18) esteve cortada entre o troço da Santa Cruz (em frente a Aldeia do Bispo) e a Vela (cruzamento da ligação à A23) devido às chamas que, vindas do vale entre aquelas localidades e o referido eixo viário, atravessaram a estrada e subiram pela Serra em direção à A23.
Segundo página na internet da Autoridade Nacional de Protecção Civil (ANPC) o incêndio estava, durante a tarde, a ser combatido por 370 homens, auxiliados por 105 veículos e dois meio aéreos.
As chamas andaram, esta segunda-feira, dentro da Guarda. A meio da tarde o fogo deflagrou junto à Via de Cintura Externa, atingindo também a zona residencial da Senhora dos Remédios e, pouco tempo depois, um outro foco de incêndio eclodiu a meio da encosta do Bairro do Pinheiro.
O incêndio, que se iria aproximar perigosamente das habitações, foi felizmente travado pelo rápido alerta desencadeado e pela pronta intervenção dos Bombeiros Voluntários.
Este incêndio, à semelhança de muitos outros não deixou de suscitar a revolta dos moradores, múltiplas interrogações e comentários bem como o registo das condições propícias à propagação das chamas.
Como é habitual nestas circunstâncias não faltaram os comentários dos persistentes “peritos” de ocasião, confortáveis na sua posição de ávidos espectadores de um flagelo que tem deixado profundas marcas na região e no País; não deixa de ser curioso que estes “especialistas” não sejam capazes de esboçar um gesto de auxílio, uma atitude de disponibilidade para ajudar (que, e bem, se verifica noutros casos e lugares, com o devida orientação quando há operacionais no terreno) com os meios que possam afetar para debelar as chamas; nestas circunstâncias é mais fácil manejar a câmara fotográfica dos telemóveis do que uma enxada, uma pá…e nas redes sociais sempre se colocam umas imagens suportadas por uns “emojis” encarnados, lacrimejantes ou expressando um incompreensível “like”…fica bem é confere uma pretensa tonalidade de intervenção cívica…
E por ali ficam a olhar para a atuação dos Bombeiros como se estes estivessem a ser os protagonistas de uma qualquer peça dramática…e estes homens, e mulheres, vivem todos os dias dramas reais e assumem, em cada dia, exemplos que deve merecer (não apenas nas festas ou galas de homenagem…) o nosso apoio, solidariedade e gratidão.
E, discorrendo ainda pelo referido incêndio, gostaria de anotar uma atitude simples mas extremamente expressiva: um jovem morador, quando os bombeiros se preparavam para sair do local, aproximou-se do voluntário mais próximo e tocando-lhe no ombro disse-lhe “obrigado!”.
Recebeu, da parte do Bombeiro, um sorriso que certamente traduzia uma íntima satisfação pela valorização dada, de forma simples e sincera, ao seu trabalho…ao verdadeiro espírito do Voluntariado, à sua relevante missão humanitária e social.
Estes homens e mulheres que vemos, nestes e noutros dias dramáticos, a enfrentar as chamas, arriscando as suas vidas, auxiliando, socorrendo, servindo até à exaustão, devem merecer o nosso respeito e admiração. Bem hajam!
in O Interior, 19.07.2017
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