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A simbologia de uma estátua...

por Correio da Guarda, em 18.12.20

 

A 6 de dezembro de 1185 D. Sancho I subiu ao trono de Portugal, sendo aclamado rei, três dias depois, na cidade de Coimbra. Uma efeméride que, nestas anotações de hoje, pretendemos sublinhar, dada a ligação histórica deste monarca à cidade da Guarda.

Recordamos que em 27 de novembro de 1199 D. Sancho I outorgou à Guarda carta de foral, documento através do qual os seus habitantes recebiam diversos privilégios, sendo igualmente concedidos incentivos ao povoamento desta zona fronteiriça, aliás dentro da estratégia defendida pelo rei português.

O seu nome, como é do domínio público, está consagrado na toponímia guardense, numa artéria que, localizada em pleno centro histórico da cidade, liga a Rua Direita ao Largo do Passo do Biu.

D. Sancho I, segundo rei de Portugal e cognominado como O Povoador, era filho de D. Afonso Henriques e D. Mafalda de Sabóia; nascido em Coimbra, em 11 de novembro de 1154, o herdeiro da coroa ficou bem cedo ligado à vida político-militar do reino português, com uma associação efetiva à governação, a partir de 1172.

Dois anos depois, o futuro rei casou com D. Dulce de Aragão (filha da Rainha de Aragão e do Conde de Barcelona), continuando a assumir responsabilidades decorrentes do seu estatuto real; em 1178 é D. Sancho que comanda uma expedição em território sob domínio muçulmano, incursão que chegou aos arredores de Sevilha.

Após a morte do pai D. Sancho ficou à frente dos destinos do reino português; a reorganização do território português e a defesa das localidades junto às, ainda, indefinidas e instáveis fronteiras com os domínios de Leão e dos muçulmanos (a sul), foram duas das suas primeiras prioridades. Estas articularam-se com a imperiosa necessidade de incrementar o povoamento e defesa das zonas conquistadas.

Assim, promoveu a vinda de colonos estrangeiros, doou terras e fortalezas às ordens militares, criou concelhos e mecanismos de administração pública, fomentou o surto económico e agrícola e concedeu forais a cerca de cinco dezenas de localidades, nomeadamente à Guarda, em 27 de novembro de 1199 (documento que segue o modelo do foral de Salamanca).

Antes desta data (1199), a Guarda confinava-se a uma pequena comunidade “guardada por uma pequena atalaia ou torre – uma guarda – que vigiava a circulação de gentes e bens que percorriam a via colimbriana, o principal eixo de penetração no planalto beirão”, como escreveu Helena da Cruz Coelho.

A Guarda assumiu, deste modo, uma posição estratégica de vital importância na defesa da linha fronteiriça da época, protagonizando a centralidade de toda a vasta região envolvente, sobre a qual afirmava a sua influência direta; a sua notoriedade como centro urbano foi reforçada com transferência (entre 1201 ou 1202) da sede do Bispado da Egitânia, cimentando assim o seu estatuto de cidade.

Esta reorganização da jurisdição religiosa apoiou os propósitos régios ao nível do fortalecimento e valorização da zona fronteiriça.

Com a conquista de Silves (que viria a perder algum tempo depois) em 1196, D. Sancho passou a intitular-se Rei de Portugal e dos Algarves. A sua permanência no trono foi atravessada por diversas contendas militares, fomes e pestes, em especial no período entre 1192 e 1210.

As lutas com o vizinho reino de Leão e sobretudo os constantes prélios com os almóadas (dinastia marroquina que dominava as terras da Península Ibérica sob alçada muçulmana) ocuparam muitos anos do reinado deste monarca português, que teve ainda de se debater com alguns sérios problemas levantados pelo clero (vejam-se os conflitos com D. Martinho Rodrigues, Bispo do Porto, e também com D. Pedro Soares, Bispo de Coimbra, com os quais se reconciliou no último ano do reinado).

A célebre cantiga de amigo “Muito me tarda / o meu amigo na Guarda”, foi durante muito tempo associada a D. Sancho I que a teria, segundo alguns autores, dedicado a D. Maria Pais Ribeiro (a célebre Ribeirinha, de quem teve seis filhos); estudos mais recentes afastaram-no da autoria dessa poesia embora seja verdade que não foi alheio às necessidades de incremento cultural, como o comprova o apoio dado a alguns elementos do clero que estudaram além-fronteiras. D. Sancho I faleceu em Coimbra em 26 de março de 1211, tendo sido sepultado no Mosteiro de Santa Cruz.

Estátua de D. SANCHO I - foto Helder Sequeira - h

A história da Guarda está indissociavelmente ligada ao segundo rei de Portugal; na Praça Luís de Camões (igualmente conhecida por Praça Velha) a sua estátua (cuja deslocalização tem suscitado os mais variados comentários e acesa controvérsia) é um dos símbolos citadinos mais visitados.

Se o local escolhido para “acantonar” a estátua do segundo rei português deve merecer uma análise serena e o confronto entre as soluções deva privilegiar uma inserção e contextualização naquele espaço com a merecida dignidade, por outro lado deveriam ser tomadas as medidas adequadas para o seu devido destaque naquela que é a sala de visitas da cidade.

Começando, desde já e sem demoras, pela iluminação noturna da estátua – que não configura grande dificuldade técnicas ou exige orçamentos significativos – de forma que não seja acentuada a ostracização a que tem sido votada; prosseguindo, sem hesitações, com a resolução definitiva do estacionamento desordenado de veículos, em redor da Catedral.

Se pretendemos uma imagem atrativa da nossa cidade, não se pode continuar a descurar pequenos pormenores que não passam desapercebidos aos visitantes e outrossim aos residentes. Até porque, como referiu Mia Couto, uma cidade “não é apenas um espaço físico” mas assume-se como “o centro de um tempo onde fabricam e refabricam as identidades próprias”.

Não esqueçamos, pois, a nossa identidade.

 

In O Interior, 17 dezembro 2020

 

 

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publicado às 23:02

815º aniversário da Guarda

por Correio da Guarda, em 27.11.14

D. Sancho I -  Foto Helder Sequeira.jpg

      A atribuição, por D. Sancho I, da carta de foral à Guarda, em 1199, é a efeméride assinalada hoje, dia do feriado municipal.

     Tradicionalmente, e após o abandono da data de 3 de Maio, o feriado municipal da Guarda era comemorado a 26 de Novembro, evocando assim o nascimento, oficial, da cidade. A divergência sobre a data de atribuição da carta de foral foi expressa, pela primeira vez, num artigo publicado, em 1985, no jornal "Notícias da Guarda".

     A partir dessa altura alargou-se o interesse pelo estudo da questão e não faltaram argumentos sobre a prevalência de 26 de Novembro; por outro lado, a favor do dia 27 deste mesmo mês os argumentos manifestaram igualmente a sua solidez.

     De facto, o documento medieval da outorga da carta de foral refere que "foi feita esta carta em Coimbra no dia Quinto antes das Calendas de Dezembro de 1237, no ano do nosso reinado." Assim, e como foi sustentado pelos investigadores que defenderam a nova data, o dia V antes das Calendas de Dezembro é o dia 27 de Novembro de 1237, o que convertido à data cristã (menos 38 anos) cai sobre o ano de 1199. A data de 27 de Novembro acabou, assim, por ser institucionalizada, há alguns anos atrás, como feriado municipal.

     Se é verdade que a outorga da carta de foral constitui um marco de referência na história desta terra, a sua origem (luso-romana, visigótica ou medieval) é uma questão à qual não foi dada ainda resposta definitiva e segura; sabe-se, isso sim, que lusitanos, romanos e visigodos deixaram por aqui traços indeléveis da sua passagem, testemunhos diversificados, igualmente espalhados pelo distrito.

    O ano de 1199 marca um período novo e mais conhecido da história guardense. Através da carta de foral os habitantes recebiam diversos privilégios e o incentivo ao povoamento desta zona, desejado pelo monarca português.

      À carta de foral da Guarda, bem como a outro importante documento conhecido por "Costumes da Guarda”, dedicou Alexandre Herculano a sua atenção, sendo realçado o contributo para o conhecimento do período medieval português.

     A história da Guarda encerra muitas e diversificadas páginas, onde emergem a sua importância militar, a sua projecção religiosa, o passar dos séculos e de vultos que sobressaíram na vida eclesiástica, política, literária ou científica. (HS)

 

 

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publicado às 07:33


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