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Sandra Ferreira iniciou bem cedo, na Guarda, a sua ligação à comunicação social. Como jornalista, o seu percurso profissional tem passado por vários órgãos de informação. Licenciada em Jornalismo pela Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, trabalhou na Rádio Altitude, Rádio F, Rádio Vaticano, jornal Público, JN-Jornal de Notícias.
Natural da Guarda, onde estudou e de onde saiu com 21 anos, Sandra Ferreira é, atualmente formadora de jornalismo em Díli, Timor-Leste. Apesar da distância não esquece a sua terra natal e diz-nos que gostaria de ver a Guarda “com menos complexos de interioridade”, acrescentando que “esse é um espírito que não ajuda a crescer, mas antes a realçar que se é pequeno e inconsequente”.
Ao CORREIO DA GUARDA esta jornalista guardense diz que os “portugueses são muito bem vistos e respeitados pelos timorenses”, referindo, por outro lado, ser “muito interessante perceber a cultura, que é muito diferente da nossa, apesar da forte e prolongada influência portuguesa”
Como começou a sua ligação à comunicação social?
A minha ligação à comunicação social começou quando tinha cerca de 16 anos, na Rádio Altitude que, na altura, abriu um concurso para recrutar novas vozes e decidi concorrer.
Acabei por ser selecionada como animadora de emissão.
O que significou a sua passagem pela Rádio Altitude?
Foi na Rádio Altitude que dei os primeiros passos que me conduziriam à profissão de jornalista, embora nessa época tencionasse formar-me em Psicologia.
Comecei a despertar para a informação, após ter acompanhado, em termos informativos, uma comitiva de Aldeia Viçosa a uma localidade da Normandia, em França, com a qual a Junta de Freguesia tinha um acordo de geminação
Nos tempos iniciais o que mais a seduziu na atividade radiofónica?
Eu adorava música e a Rádio Altitude tinha à época uma discoteca impressionante, com mais de 20 mil discos.
Era muito interessante passar horas a descobrir êxitos de várias gerações, saber mais sobre os artistas e partilhá-los.
A rádio tinha aquele lado encantador de sermos identificados apenas pela voz, sem sites na internet a revelarem-nos o rosto. Por outro lado, era muito estimulante trabalhar junto de profissionais, como o histórico António Aragonês, com uma magnífica voz e um excelente contador de estórias.
Após a sua saída da Guarda o que fez, em termos profissionais?
Antes de sair da Guarda, passei pela Rádio F e poucos meses depois, o dono, o Dr. Virgílio Ardérius, que tinha comprado a Rádio Noar, em Viseu, que estava encerrada, desafiou-me a fazer parte da equipa que a iria reativar.
Foi uma luta enorme, deu muito trabalho, mas foi uma grande escola e um sucesso até a frequência ter sido vendida, em 2011, à Rádio Renascença.
Pelo meio, quando estava a tirar a licenciatura em Jornalismo, na Universidade de Coimbra, fiz uma interrupção e fui para a capital italiana, estudar na Universidade Roma Tre, no âmbito do programa Erasmus. Ao mesmo tempo, enviei o currículo para a rádio Vaticano, onde fui aceite para trabalhar na rádio que agrega quase 40 nacionalidades.
Fiz também algumas dobragens de documentários e filmes no estúdio Cine-Cità. Já depois de regressar a Portugal, trabalhei para o Jornal Público e para o Jornal de Notícias.
Atualmente sou formadora de jornalismo em Díli, Timor-Leste, no Consultório da Língua para Jornalistas.
E o que mais gostou de fazer?
Sempre gostei de vestir a camisola dos sítios por onde passei e para mim só faz sentido enquanto assim for.
É difícil dizer o que mais gostei porque cada projeto implicou desafios distintos, mas diria que o que algo em comum que sempre me agradou foi somar conhecimento com ótimos profissionais, refletir sobre o conhecimento que fui adquirindo e que hoje me permite partilhá-lo com quem quer seguir a profissão.
A sua preferência, hoje, vai mais para a Rádio ou para a Imprensa?
Nunca consegui fazer essa escolha, cada meio tem a sua especificidade.
Enquanto a rádio é muito desafiante por tudo o que consegue transmitir com som, por trabalhar para o ouvido, a imprensa explica e permite acrescentar detalhes, nem sempre possíveis em rádio.
A Rádio ontem e hoje? Que diferenças? Hoje é mais fácil fazer rádio?
A rádio hoje já não é só som, também é imagem. Graças à internet também dá texto a ler, exibe vídeos e fotos nos respetivos sites e redes sociais.
Também já não é tão efémera porque, através dos podcasts, podemos ouvir programas quando e onde quisermos.
No entanto, não sei se é mais fácil fazer rádio nos dias que correm porque a pressão aumentou uma vez que este meio concorre diretamente com as plataformas online.
A internet e os telemóveis facilitam muito a chegada dos conteúdos aos ouvintes, fazer diretos, mas também é preciso ser muito mais veloz para não ser ultrapassado, o que também proporciona muitas falhas de rigor. Evitar essas falhas é hoje um dos maiores desafios do jornalismo em nome da sua credibilidade.
Atualmente está em Timor. O que está a fazer e como surgiu esta mudança na sua vida profissional?
Em abril deste ano, venci um concurso público lançado pela Secretaria de Estado da Comunicação Social de Timor-Leste, para formadora de jornalismo no Consultório da Língua para Jornalistas.
Aceitei o cargo, tive um mês para fazer as malas e todas as mudanças e mudar-me para Díli.
Na prática deixei de fazer jornalismo, mas passei a partilhar o conhecimento que adquiri ao longo dos anos.
Como é o seu dia a dia?
Este trabalho tem obrigado a um grande foco, de manhã à noite, por vezes até ao fim de semana.
Antes da formação de Jornalismo propriamente dita, foi necessário fazer um estudo sobre as necessidades formativas dos jornalistas de Timor-Leste, onde está quase tudo por fazer na área.
Tratou-se de um estudo inédito, que implicou analisar centenas de notícias à lupa de dezenas de critérios, realizar inquéritos junto dos formados, perceber onde sentiam dificuldades, entrevistar responsáveis pela comunicação social, observar o modo de atuação dos jornalistas. O relatório deste estudo, que já foi concluído, será publicado em livro. Identificadas as necessidades formativas traçou-se um plano de formação e elaboraram-se manuais destinados aos formandos.
Fora do trabalho, em Díli não há muito para fazer, mas quando há tempo gosto de aproveitar o mar com água muito quente ou conhecer outras zonas de Timor-Leste. Ainda não foi possível conhecer muito por causa da pandemia que colocou Díli sob cerca sanitária até há dois ou três meses.
O que mais lhe tem agradado em Timor?
Os timorenses são pessoas muito tímidas, mas muito afáveis.
Tem sido muito interessante perceber a cultura, que é muito diferente da nossa, apesar da forte e prolongada influência portuguesa.
É curioso perceber que está a surgir uma geração com um grande espírito crítico e a falta de massa crítica é um dos graves problemas do país.
A presença portuguesa como é vista hoje, em Timor?
Os portugueses são muito bem vistos e respeitados pelos timorenses.
Existem muitos projetos ligados ao ensino executado por centenas de professores portugueses, que exercem a profissão muitas vezes em condições muito difíceis, sobretudo nos municípios distantes da capital.
A educação é um dos problemas graves de Timor-Leste, pelo que os timorenses respeitam muito quem os quer ajudar nua educação melhor.
Até quando vai ficar?
Esta fase do projeto do Consultório da Língua para Jornalistas tem uma duração de três anos, mas não sei quanto tempo irei ficar.
Quais são os seus projetos para o futuro?
Depois deste projeto está tudo em aberto, mas julgo que será sempre no âmbito do jornalismo e/ou na área da formação. Em Díli ou noutra parte do mundo.
Continua a seguir o que se passa na Guarda?
Sim, continuo a seguir, dentro do tempo que tenho disponível.
O que representa para si a Guarda? Que memórias?
É onde nasci, é onde estão os meus pais e as minhas duas irmãs.
Foi onde vivi até aos 21 anos, por isso tenho na Guarda toda a minha infância e adolescência.
A maior memória que tenho da Guarda, além do frio, é de a cidade ter um grande espírito de acolhimento e convívio.
Como gostaria de ver a Guarda do futuro?
Gostava de ver a cidade com mais oportunidades de emprego, de a ver evoluir a todos os níveis e também com menos complexos de interioridade.
Julgo que esse é um espírito que não ajuda a crescer, mas antes a realçar que se é pequeno e inconsequente.
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