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Em Manteigas vai decorrer de 14 a 17 de maio a Manta-Semana Cultural.
O programa integra tertúlias com música e poesia, debates sobre escrita e criatividade, bem como apresentações de livros.
Esta semana cultural é organizada pela Câmara Municipal de Manteigas. O programa pode ser consultado aqui.
O “Culto Privado das Almas” foi a temática do percurso pedestre que a Associação de Jogos Tradicionais da Guarda (AJTG) promoveu no passado dia 5 de abril, nas aldeias de Trinta, Corujeira, Fernão Joanes e Meios (concelho da Guarda). Uma iniciativa que foi realizada em parceria com o município guardense.
Como foi referido a propósito deste percurso, pretendeu-se levar os participantes à descoberta do património cultural material e imaterial, mas também do património natural daquela área do concelho da Guarda, num trajeto de sete quilómetros. A AJTG já no ano passado tinha promovido (a 23 de março) o “Percurso das Alminhas” que com início na Menoita passou por várias localidades da freguesia de Pêra do Moço: Menoita, Rapoula, Pêra do Moço e Verdugal; com incidência no património local e na identificação de alminhas.
Singelos monumentos expressivos da religiosidade popular, as “Alminhas” constituem um património ímpar que não tem merecido a devida atenção e a necessária salvaguarda; deste modo, iniciativas como esta protagonizada pela Associação de Jogos Tradicionais da Guarda são de registar, aplaudir, incentivar e apoiar.
Na nossa região existem inúmeros testemunhos do culto das almas, sob diversificadas manifestações de arte e nos mais distintos lugares, embora os caminhos e as encruzilhadas tenham constituído locais privilegiados para a sua implantação.
A representação do Purgatório num oratório, retábulo ou painel, com chamas envolvendo as almas que suplicam aos santos e apelam ao auxílio das preces de quem passa, materializou-se, inicialmente em pinturas, a partir do século XVI; conheceu uma maior difusão no século seguinte, no território português, com maior incidência a norte do Mondego (a sul essa manifestação artística ficou, muitas vezes, no interior das igrejas e nas capelas das Irmandades).
Embora alguns estudiosos desta temática sustentem que as “Alminhas” se tenham inspirado e sejam uma herança das “civilizações clássicas de Roma e Grécia que nas suas deambulações já haviam erguido monumentos junto às estradas para devoção aos seus deuses”, sabemos que a origem das alminhas surge na Idade Média.
A partir do Concílio de Trento,1563, a ideia do Purgatório (anteriormente, e em especial nos primeiros séculos do cristianismo existia apenas o Céu e o Inferno) é imposta como dogma, atitude que é interpretada como uma resposta da Igreja Católica à reforma implementada pelos protestantes. Assim, o Purgatório surgia como um local (entre o Céu, para os bons, e o Inferno, para os maus) onde as almas passavam por um estado, forçado, de purificação. Aliás, estas manifestações de religiosidade popular e de arte eram, simultaneamente, um alerta permanente para a fragilidade da vida, perante a certeza da morte.
As “Alminhas” eram erguidas, normalmente, por iniciativa individual como homenagem, em memória de familiares ou no cumprimento de promessas. Esta devoção popular atravessou séculos e embora a meio do século passado tenha sido evidente um rejuvenescimento através da introdução da azulejaria (e alterado o culto inicial para manifestação de fé em santos da predileção pessoal), muitos destes pequenos monumentos, mercê do tempo e da desertificação das regiões, caíram no esquecimento e em progressiva degradação.
“Ó vós que ides passando, lembrai-vos de nós que estamos penando”… Este apelo, inscrito em inúmeras “Alminhas”, bem pode ser, na atualidade, dirigido a todos nós que temos esquecido este peculiar património (não são conhecidos muitos mais exemplos – com exceção para alguns casos, raros – na Europa), disperso por caminhos, muros, pontes, campos, estradas…
Assim, o projeto da AJTG centrado no “Culto Privado das Almas” é um eminente contributo para a salvaguarda, estudo e defesa deste património que pode ancorar uma diversidade de roteiros, mas também suscitar investigações contextualizadas em épocas ou tipologias dessas expressões de religiosidade, permitindo a sua descrição/história através de códigos disponibilizados pelas novas tecnologias; exigindo igualmente a adequada sinalética e iluminação (mesmo nos locais mais ermos isso já é viável, através de focos/luminárias com energia solar).
No concelho e no distrito da Guarda (como noutras regiões, obviamente) é urgente, fundamental, a referenciação (ou continuidade desse trabalho), a defesa, o estudo (por equipas interdisciplinares) e a divulgação das Alminhas, sob o risco de perdermos mais um importante traço identitário do nosso património e cultura.
Hélder Sequeira
O CardealJosé Tolentino de Mendonça é o vencedor da vigésima primeira edição do Prémio Eduardo Lourenço, instituído pelo Centro de Estudos Ibéricos (CEI), numa decisão unânime do júria que reuniu hoje na Guarda.
De acordo com a informação divulgada pelo CEI, o Júri reconheceu o perfil do intelectual, do humanista e do poeta que marca inequivocamente a cultura portuguesa contemporânea; reconheceu igualmente o pensador ecuménico e do diálogo que, com a sua obra, nos ensina que a fronteira é um mistério de encontro.
"Na ocasião dos 25 anos do Centro de Estudos Ibéricos, o Prémio Eduardo Lourenço 2025 distingue, na personalidade de José Tolentino de Mendonça, o valor da Educação e da Palavra como fontes de inspiração para fortalecer laços que cruzam todas as fronteiras e dos quais o diálogo ibérico tem sido exemplo."
Tolentino de Mendonça é poeta e professor. Nasceu na ilha da Madeira e estudou Ciências Bíblicas em Roma. Vive no Vaticano desde 2018, onde foi responsável pela Biblioteca Apostólica e pelo Arquivo Secreto. É atualmente prefeito do Dicastério para a Cultura e a Educação. Em 2019, foi elevado a cardeal pelo Papa Francisco.
Destinado a galardoar personalidades ou instituições com intervenção relevante no âmbito da cultura, cidadania e cooperação ibéricas, o Prémio Eduardo Lourenço 2025, no montante de 7.500,00€ (sete mil e quinhentos euros), foi atribuído por um júri constituído pelos membros da Direção do CEI: Presidente da Câmara Municipal da Guarda, Sérgio Costa e os Vice-Reitores das Universidades de Coimbra e de Salamanca, Delfim Leão e Matilde Olarte; Manuel Santos Rosa e Luís Umbelino, da UC, Antonio Notario e María Isabel Martín Jiménez, da USAL; e pelas seguintes personalidades convidadas: António Apolinário Lourenço e Désirée Pedro indicadas pela Universidade de Coimbra e Juán Andrés Blanco e María Teresa Conesa, indicadas pela Universidade de Salamanca.
Personalidades de relevo de Portugal e Espanha galardoadas em anteriores edições: Maria Helena da Rocha Pereira, Professora Catedrática de Cultura Greco-Latina (2004), Agustín Remesal, Jornalista (2006), Maria João Pires, Pianista (2007), Ángel Campos Pámpano, Poeta (2008), Jorge Figueiredo Dias, Professor Catedrático de Direito Penal (2009), César António Molina, Escritor (2010), Mia Couto, Escritor (2011), José María Martín Patino, Teólogo (2012), Jerónimo Pizarro, Professor e Investigador (2013), Antonio Sáez Delgado, Professor e Investigador (2014), Agustina Bessa-Luís, Escritora (2015), Luis Sepúlveda, Escritor (2016), Fernando Paulouro das Neves, Escritor e Jornalista (2017), Basilio Lousada Castro, Escritor (2018), Carlos Reis, Professor e Investigador (2019), Ángel Marcos de Dios, Professor (2020), Fundação José Saramago (2021), Valentín Cabero Diéguez, Geógrafo e Professor (2022), Lídia Jorge, Escritora (2023) e Isabel Soler (2024).
Fonte: CEI
Adriano Vasco Rodrigues, historiador e ex-Governador Civil da Guarda, faleceu hoje no Porto. Natural da Guarda, onde nasceu a 4 de maio de 1928, Adriano Vasco Rodrigues foi um homem de cultura que desenvolveu a sua atividade nas áreas da história, arqueologia, etnografia e igualmente no ensino; teve ainda uma destacada intervenção na política e na administração pública.
“A Catedral da Guarda na História e na Poesia” (1953), “Prospecções Arqueológicas na Região de Longroiva” (1954), “Subsídios Arqueológicos para a História de Celorico da Beira “(1956), “Monografia artística da cidade da Guarda” (1957), “”Retrospetiva Histórica dos Concelhos de Meda, Longroiva e Marialva (1976), “Celorico da Beira e Linhares: monografia histórica e artística” (1979), “Terras da Meda: Natureza e Cultura” (1983), “Guarda - Pré-História, História e Arte (Monografia)” (2001), e “Salvador de Nascimento: Uma Vida - Um Ideal” (2005) são algumas das suas obras.
Adriano Vasco Rodrigues, que dirigiu a Revista Altitude (editada pela Assembleia Distrital da Guarda), iniciou a sua atividade na docência no ano de 1951, após ter concluído o Curso da Escola do Magistério Primário do Porto, lecionando como professor do ensino primário (designação à época). Cinco anos depois licenciou-se em Ciências Históricas e Filosóficas na Universidade de Coimbra, onde completou também o curso de Ciências Pedagógicas.
Adriano Vasco Rodrigues especializou-se depois em História da Arte Medieval na Universidade de Santiago de Compostela, onde fez o Curso de Língua e Cultura Espanhola. Lecionou no ensino secundário, inicialmente como professor eventual, profissionalizando-se em 1960. Entre 1958 e 1962, deu aulas no ensino superior, no curso de Arqueologia Peninsular no Centro de Estudos Humanísticos da Universidade do Porto.
Em Angola desempenhou, entre 1965 e 1969, as funções de Inspetor Provincial Adjunto da Educação, tendo dinamizado a formação de professores e organizado a secção de Arqueologia do Museu de Angola; em parceria com sua esposa Maria da Assunção Carqueja Rodrigues, produziu a primeira Carta da Pré-História de Angola.
Entre 1969 a 1974, foi reitor e organizador do Liceu-Piloto Garcia de Orta. Nos anos seguintes assumiu funções em cargos de destaque na administração pública e política, tendo sido deputado independente da Assembleia da República pelo CDS-PP (1976-1982), Governador Civil da Guarda (1982-1983) e Diretor-Geral do Ensino Particular e Cooperativo (1983-1986).
Em 1988, assumiu, por concurso internacional, o cargo de Diretor da Schola Europaea, na Bélgica, organismo da União Europeia, onde esteve em 1996.
Na Universidade Portucalense, a partir de 1997, desenvolveu pesquisas e cursos livres nas áreas de Arte Africana, Numismática, História das Religiões e Antiguidades.
Foi distinguido, em 1994, pela Câmara Municipal do Porto que lhe atribuiu a Medalha de Ouro; em 1996 o Presidente da República, Jorge Sampaio, atribuiu-lhe a Comenda da Ordem do Infante D. Henrique. Em 2009, no decorrer da jornada de homenagem que lhe foi prestada na Guarda foi-lhe entregue a medalha de mérito pelo Instituto Politécnico e a Medalha de Ouro da Cidade, pela Câmara Municipal.
O funeral de Adriano Vasco Rodrigues terá lugar na sexta-feira (24 de janeiro), pelas 10h30, estando o corpo em câmara ardente a partir das 11 horas de amanhã na Igreja de Cristo Rei, Porto.
Na Guarda foi ontem apresentada a agenda cultural para os meses de janeiro, fevereiro e março.
A programação apresenta mais de 100 propostas nos três equipamentos culturais da cidade – Teatro Municipal da Guarda (TMG), Biblioteca Municipal Eduardo Lourenço (BMEL) e Museu da Guarda (MG) – e em vários espaços do concelho. Estão, assim, agendas, iniciativas para públicos e interesses variados na área da dança, música, teatro, cinema, exposições, oficinas e programadas várias conferências, visitas guiadas e apresentação de livros.
Ontem, no TMG, teve lugar o espetáculo 'Vamos Cantar as Janeiras' em Dia de Reis (6 de janeiro) “numa celebração da tradição e identidade coletiva.” No dia 11, o Grande Auditório volta a ser palco de um outro evento, o Concerto de Ano Novo, com a Ópera Die Fledermaus pela Orquestra Filarmónica Portuguesa.
No dia 16, o Pequeno Auditório recebe duas sessões do espetáculo visual e sonoro 'Spectrum', uma criação de Rui Pires/ASTA que pretende criar um espaço virtual onde a tecnologia atual se cruza com a arqueologia dos media.
A 18 de janeiro, a música chega pelo nome Manel Cruz, a voz dos Ornatos Violeta, Foge Foge Bandido e Pluto.
Ainda em janeiro, o teatro regressa ao TMG com Artistas Unidos que vão interpretar '1984' de George Orwell, obra do escritor inglês na versão de Robert Icke e Duncan Macmillan.
O mês de fevereiro começa no TMG com um espetáculo de ballet 'Carmen' de Bizet pelo Ballet Flamenco de Barcelona; este espetáculo mistura canto, dança e ópera (10 bailarinos e 5 músicos em palco), com coreografias tradicionais e contemporâneas.
A cantora Gisela João sob ao palco do Grande Auditório do Teatro Municipal da Guarda a 15 de fevereiro, para apresentar o seu mais recente trabalho.
'A Morte Saiu à Rua' é o primeiro single do novo álbum da artista portuguesa editado este mês. “Neste novo single, Gisela João e reinterpreta a icónica canção de Zeca Afonso, de 1972, acrescentando profundidade e criando uma mistura inesquecível entre tradição e contemporaneidade.”
A 20 e 21 de fevereiro, Snails on Speed apresenta 'Oprime.iRa', um espetáculo de teatro e arte digital, com texto e encenação: Gabriel Godinho e Valdemar Santos.
Ainda em fevereiro (dia 26) os 'Amigos da Treta' vão dar nova vida ao fenómeno de popularidade do teatro cómico criado em 1997 como 'Conversas da Treta' por António Feio e José Pedro Gomes.
No mês de março, o Teatro Físico apresenta 'Cocktail da Evolução JAT – Janela Aberta Teatro', no Café Concerto, no dia 7 de março. São dois espetáculos (interpretados por Diana Bernedo e Miguel Martins Pessoa) “que transportam o público por diferentes géneros, desde o drama, à comédia à tragicomédia, através de linguagens.” No dia seguinte (8 de março) a proposta é o espetáculo de dança 'Se Desta Janela, Debruçando-me', uma criação de Paulo Brandão a partir de 'O Marinheiro' de Fernando Pessoa.
Os Virgem Suta sobem ao palco do Grande Auditório na noite de 14 de março. A celebrar 15 anos de carreira, os Virgem Suta apresentam o seu quarto álbum. A 29 de março é a vez da banda Bateu Matou, um formado por Ivo Costa (Sara Tavares), Quim Albergaria (Paus) e Riot (Buraka Som Sistema).
De referir que no Teatro Municipal da Guarda continuam também patentes três exposições: 'Transversalidades Fotografia Sem Fronteiras 2024' no Foyer e 'Memória, Que Futuro para o Nosso Passado' no Edifício Polifónico até final de janeiro e 'Cidade – Os mapas imaginados e a Arte Urbana Projetada' até abril.
Neste primeiro trimestre do ano, a Biblioteca Municipal Eduardo Lourenço prossegue com o projeto 'Guarda Memórias' destinado aos centros de dia e lares no concelho da Guarda, que visa estimular e recolher memórias e para serem guardadas no fundo local da Biblioteca e haverá um conjunto de iniciativas dedicadas às famílias e aos mais jovens.
A 22 de janeiro terá lugar o espetáculo de teatro 'Sermão Stº António aos Peixes' destinado aos alunos do 11º ano dos dois agrupamentos de escolas da cidade e dia 27 será apresentado o livro 'O menino no Mundo só seu', de Susana Campos, dirigido aos alunos do 1º e 2º ciclos.
Em fevereiro o teatro regressa dia 13 com o espetáculo 'Sonhos D'Piratas' por Birra Produções, numa atividade dirigida aos alunos do 6º ano dos agrupamentos de escolas.
Tiago Sami Pereira apresenta no dia 21 de fevereiro a exposição e performance musical 'Retalhos'. O Dia Mundial da Poesia celebrado a 21 de março será assinalado com duas iniciativas: uma oficina em torno do poema 'Poema Adentro, Poema Afora', para crianças dos 8 aos 12 anos, e um espaço em que a poesia encontra a singularidade de cada pessoa.
Na programação do Museu da Guarda destaca-se a inauguração do Museu-Escola em Aldeia Viçosa (dia 1 de fevereiro) integrada na Rede Cultural e Criativa da Guarda e a apresentação pública do catálogo editado sob a chancela da Documenta «O frio da casa permanece no meu corpo» de Albuquerque Mendes por Valter Hugo Mãe, no dia 30 de janeiro.
No dia 6 de fevereiro será inaugurada 'Luz - No fundo, é a dúvida da visão', de Manuel Gantes, que ficará patente na Galeria d'Arte Evelina Coelho até 27 de abril. Ainda em fevereiro será inaugurada dia 13 a exposição de gravuras e aguarelas 'Entre gramagens', de Simone dos Prazeres, com curadoria de Antonio Navarro, patente na Galeria Espaço #4 até 4 de maio.
A 21 de março haverá um 'Recital de Primavera' pelo Conservatório de Música de São José da Guarda no Auditório do Museu da Guarda e nos dias 28 e 29 de março serão realizadas as Jornadas de Arqueologia – III Ciclo Arqueologia na Comunidade: Comunicações. A iniciativa, que inclui uma ação de formação e visita orientada ao Centro Histórico da Guarda, assinala o Dia Nacional dos Centros Históricos.
Fonte: CMG
António Manuel Gomes é um conceituado médico psiquiatra e igualmente um exímio artífice de palavras que florescem em textos de inegável recorte literário. Este clínico guardense – homem culto, observador atento, dialogante – nunca se negou a desafios ao nível da intervenção cívica e cultural, numa manifesta expressão de exemplar cidadania. Avesso a holofotes, nem sempre a sua atividade teve a justa e merecida visibilidade. “O reconhecimento, não o nego, afaga a alma e dá consistência à identidade” diz nesta entrevista ao CORREIO DA GUARDA quando questionado sobre a distinção que vai receber no dia da Cidade da Guarda, na próxima quarta-feira, a 27 de novembro. Homenagem que faz questão em distribuir com “os outros que são parte de mim”. Ao CG afirma que a escolha da Medicina não foi resultado de um “chamamento ou vocação”, mas cedo compreendeu que “não me tinha enganado no destino”. Considerando que “os êxitos, fracassos e problemas, são inerentes à vida de um médico”, António Manuel Gomes classifica, “em termos sincréticos” como “muito positivo um longo período do SNS em que as turbulências eram claramente menores e a relação interpessoal tinha outra densidade humana.”
Nascido nas Vendas da Vela, em outubro de 1954, António Manuel Gomes estudou na Covilhã e em Coimbra, trabalhou no Hospital Psiquiátrico do Lorvão, dirigiu o Departamento de Psiquiatria do Hospital Sousa Martins, integrou os corpos sociais da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários Egitanienses, foi fundador do grupo de Teatro à Vela e do grupo coral Recanto do Canto, tendo encenado três peças de teatro e sido o autor de contos e textos publicados em jornais e revistas.
Estudou a partir dos 7 anos na Covilhã. Qual a razão que o levou a ir para essa cidade?
Os meus pais sempre residiram na Covilhã. Foi por acaso e urgência que nasci nas vendas da vela, em casa dos meus avós maternos, onde a minha mãe se encontrava naquele dia, com 24 anos, e aconchegada no ninho original.
Fiz a quarta classe numa obra da fundação Melo e Castro, designada Associação Protectora da Infância Desvalida. Este longo e expressivo nome, resultava do facto de a escola dar resposta aos filhos das operárias e operários dos lanifícios; ao tempo já tinha cantina para as crianças.
Devo às preocupações do meu pai com o meu ingresso na escola primária, a descoberta de um tal professor Manuel Poeta. Conseguiu que eu entrasse naquela instituição onde, de resto, pelas mesmas razões de excelência do docente, também tive alguns filhos de industriais como colegas. Foi determinante no meu futuro escolar. Quando concluí a quarta classe foi-me atribuído o prémio de melhor aluno pela fundação Melo e Castro.
Foi ainda na Covilhã que concluí o sétimo ano do liceu, sendo na altura o único aluno que dispensou do exame de admissão ao ensino superior em todas as disciplinas.
Como via, nessa altura, a cidade da Guarda? Que contraponto fazia com a Covilhã?
As minhas deslocações à Guarda eram esporádicas. A viagem na camioneta do Tonico começava na Covilhã e acabava nas Vendas da Vela. Ainda assim recordo a Guarda como uma cidade aconchegada, de humanidade sadia, como uma extensão rural e telúrica que o meu avô me tinha ensinado.
A Covilhã, era um uivo de sirenes quase permanente. O corrupio dos operários e operárias, ora saindo, ora entrando, nas dezenas de fábricas de lanifícios, dava às ruas e às travessas um alarido enérgico e contagiante que me enchia a estreita paisagem da janela de casa.
O que representou a sua ida para Coimbra e como foi a adaptação à vida académica da cidade? A vivência na residência do Colégio de São Teotónio é um período com boas recordações?
As lágrimas de despedida de casa secaram depressa. Não ia só. Éramos vários colegas de liceu, dispersos por vários cursos, e já tínhamos laços consistentes. A residência universitária do colégio de São Teotónio deu-nos um conforto e um acréscimo de novas relações; as maluqueiras coletivas e as discussões no refeitório são ainda hoje retalhos da minha memória distante que muito prezo.
A Universidade de Coimbra, em 1972, mantinha o luto académico que já vinha dos 4 anos anteriores. Não havia praxe nem queima das fitas; as capas e batinas concentravam-se num número muito exíguo de estudantes e as conotações conservadoras eram vorazes.
O ambiente académico era propício ao incremento de atividades culturais? Como viveu Coimbra em termos culturais?
Viver Coimbra antes, durante e depois do 25 de abril, foi um privilégio que tocou a poucos, mas calhou-me a mim.
O antes já era uma surdina de palavras proibidas e irreversíveis cujo contágio era imparável. Um dia, ao sair da minha primeira aula teórica de química médica, juntamente com mais três colegas, saiu do Nívea (Volkswagen da polícia) um agente que veio junto de nós e nos mandou dispersar. Éramos quatro e íamos almoçar à cantina. Era a própria polícia que, paradoxalmente, nos tirava a ingenuidade e incentivava à resistência.
O durante foi uma flutuação frenética entre a incredulidade e a esperança; mas o primeiro 1º de Maio tornou-se o grande clamor da irreversibilidade.
O depois, na academia, traduzia o país. As paixões despontavam numa fragmentação política de marcado pendor à esquerda. As derivas tornavam-se evidentes e as discussões descomprimidas e abertas inundavam as mesas dos cafés e as reuniões gerais de estudantes. No cinema, no teatro e nas palavras escritas, surgia um mundo novo até então desconhecido pela maioria de nós.
Quais as leituras e as músicas que ouvia mais nessa época? Os seus gostos alteraram-se?
As músicas eram partilhadas por todos e as descobertas eram permanentes. Woodstock operou uma viragem nos gostos e na liberdade. Os cantores de intervenção, portugueses e estrangeiros, eram obrigatórios nas noitadas de alegria e copos. Lembro-me de um opúsculo clandestino com letras do Manuel Alegre musicadas que era obrigatório em todos os encontros.
Ainda a propósito do poeta, sintonizávamos a rádio Argel, antes da revolução, e lá estava a sua voz inconfundível. Os meus gestos caminharam com o tempo e a idade, e ainda hoje são feitos de muitas partilhas e descobertas. Não fiquei ancorado nos deslumbramentos de juventude, mas ainda hoje são referências que partilho com os meus netos, e eles também gostam.
O que recorda de mais positivo e de mais negativo na sua passagem pela Universidade de Coimbra?
Vivi em Coimbra dos 17 aos 34 anos. Ao tempo, a academia era um amplo espaço de convívios e estímulo. A Praça da República era o grande pátio da universidade. Por ali deambulavam as figuras de referência das várias faculdades. Este borbulhar era fascinante, e todas as conversas nos guindavam para novos planos de descoberta e liberdade. Mesmo na discórdia, estava instalada uma alegria inaugural que contagiava a comunicação.
De negativo, talvez recorde momentos de tensão estudantil desencadeados por processos de manipulação e radicalismo, levados a cabo por correntes ideológicas múltiplas onde o padrão de alienação se instalava de modo acrítico e obstinado.
Formou-se em Medicina e especializou-se em Psiquiatria? Porquê esta opção?
Fui para a medicina por uma espécie de acordo de grupo entre alguns colegas de liceu. Não me lembro de sentir um chamamento ou vocação; mas cedo percebi que não me tinha enganado no destino.
A psiquiatria aconteceu pela influência específica e incentivo do doutor Manuel Lousã Henriques. Era uma referência de Coimbra em termos psiquiátricos, culturais e humanistas. Tive a sorte de o ter como assistente de psiquiatria quando fazia a cadeira, e quando acabava a aula ninguém tinha dado pelo passar do tempo. Aconselhou-me o Lorvão.
A partir da especialização como foi o seu percurso profissional? Que êxitos e que problemas registou, sucintamente, ao longo do período em que exerceu a sua atividade, no SNS? E que importância teve a sua passagem pelo Hospital do Lorvão?
A especialização decorreu no hospital psiquiátrico do Lorvão, onde 3 jovens psiquiatras residentes tiveram, pela abrangência, pelo entusiasmo, pelo arejamento e pela inovação, uma influência determinante na minha formação.
Os êxitos, fracassos e problemas, são inerentes à vida de um médico. Mas, em termos sincréticos, sinto como muito positivo um longo período do SNS em que as turbulências eram claramente menores e a relação interpessoal tinha outra densidade humana.
O facto de ter pertencido às gerações que prestaram o serviço médico à periferia, enraizou para sempre uma crença no recém-implantado SNS. Mas o curso dessa crença tem vindo a desagregar-se. As razões não cabem aqui nem são lineares; mas, o resultado final insatisfaz os doentes e desanima os profissionais de saúde. Não sei quando nem como nos vamos reencontrar.
O Hospital da Guarda diferenciou-se na área da Psiquiatria? As instalações condicionaram/condicionam a atividade médica?
Quando há 37 anos fui convidado, com o Paulo e o Antídes, para abrir um serviço de psiquiatria na guarda, a decisão não foi demorada. Inicialmente na Praça velha, como centro de saúde mental, sem serviços de internamento próprio, desenvolvíamos consultas em articulação com os 14 centros de saúde do distrito e os casos urgentes eram encaminhados para o internamento do Lorvão.
Quando passámos a ocupar as atuais instalações do departamento de psiquiatria, integrados no hospital Sousa Martins, sempre sentimos a casa e a causa como nossas. Fomos muitos e sucessivos a arregaçar as mangas. Talvez por isso nunca nos sentimos condicionados nem num espaço exíguo.
A psiquiatria tornara-se centrífuga e ainda continuamos a visitar no seu domicílio mais de 300 doentes por mês, em todo o distrito.
Que projetos não viu concretizados, em termos hospitalares?
Volvidos 37 anos, com novas realidades e ambições, lamento, sem hesitação, que não se tenha construído um novo departamento.
Como vê, atualmente, a saúde mental em Portugal? Há falta de recursos humanos e de unidades de tratamento e acompanhamento?
Penso, como em tudo, que já estivemos pior. Ainda assim há muitas assimetrias e a resposta não é linear.
A maior densidade populacional; novas patologias sociais de desenraizamento e deslaçamento afetivo; défice crescente de comunicação corpo a corpo; imputação de responsabilidades e deveres aos outros; eu sei lá… Mais do que problemas de saúde mental, há um caldo doentio que nos circunda e inquieta. Às vezes não são os percursos é o modo como se recorre aos recursos.
Acha que a recente pandemia agravou os problemas no contexto da saúde mental? Aumentou a conflitualidade social?
Nos idosos a pandemia teve um efeito devastador. Para além da morte, e sobretudo nos doentes institucionalizados, o embate nas funções cognitivas e motoras foi imenso e irreversível.
Nos restantes grupos etários, com a plasticidade inerente a cada idade, houve um claro acréscimo das doenças ansiosas e depressivas com fenómenos de antecipação e medo. As fobias obsessivas em menor expressão, assim como as patologias paranóides.
Quanto à conflitualidade social, sinto-a hoje teimosamente residente e sem carecer de pandemias para se alimentar.
Como aconteceu a sua ligação aos Bombeiros da Guarda? Que balanço faz desse período?
Foi o Pedro Lopes e o Álvaro Guerreiro que me convidaram para integrar uma direção. Depois fiquei mais de vinte anos. É uma casa que ficou a fazer parte de mim como de muitos outros que por lá passaram.
Os bombeiros são simultaneamente homens e mulheres com um imenso espírito de solidariedade e entrega, como “vidrinhos” de uma sensibilidade ressentida. É como se uma cristalização da adolescência lhes ficasse agarrada à pele. É essa mistura mágica que faz aquela casa e o sentido a que se propõe.
Acha que o voluntariado está em crise?
Esta pergunta acrescenta novas nuances à resposta anterior. A crescente e necessária profissionalização dos bombeiros para que se ajustem à sempre velha e nova realidade do fogo, conduziu ao decréscimo do voluntariado tradicional.
Ainda assim continuo a acreditar nesta determinação estruturalmente humana. Enquanto houver uma criança de olhos desorbitados deslumbrada com a enormidade elegante dum carro de bombeiros, o voluntariado terá sempre um fogo interior que o move. E todas as formas de voluntariado carecem desse fogo interior que anule o individualismo e o alheamento.
Está profundamente ligado à criação do grupo de “Teatro à Vela” e do grupo coral “Recanto do Canto”. O que representaram para si, e para a Vela, estes dois grupos e qual a projeção que tiveram?
O que representaram para Vela, talvez não me caiba a mim a avaliação. É preciso que o tempo aglutine a distância e as memórias. O que representou para mim é um desassossego enorme de vivências e emoções. Vou aglutinar-me: tinha regressado de Coimbra com a família; a Vela ainda lambia as feridas de cisões políticas estéreis; o Álvaro era mordomo e desafiou me a escrever uma peça; lembrei-me da adolescência na quinta dos meus avós; do Padre Amarelo me vir buscar para entrar no teatro; fui à procura dos “velhos” que eu tinha visto em palco quando garoto; todos me disseram que sim; esbocei o projeto e li-o em grupo; no final vi algumas lágrimas, talvez estivesse certo; depois foi meter no palco avós, filhos e netos; a Taverna comportava a vida; transformou-se numa peregrinação de alegria que nos ultrapassou (e a mim, sobretudo).
O Recanto do Canto veio mais tarde como um complemento de disciplina e organização. O Mário Barreiros e a sua tranquilidade gentil levaram-nos a quatro vozes numa polifonia que mais tarde emudeceu, mas ainda a oiço na memória.
Escreveu e encenou três peças de teatro. O que significa para si o teatro e como vê hoje, à distância de alguns anos, estas peças e o sucesso que alcançaram?
Sim. A Taverna (en)cantada; o Sagrado e o profano e a Cesta de fantoches. A Taverna durou mais de doze anos e somou cinquenta e quatro representações em vários pontos do país. Éramos saltimbancos de alegria. Ver avós, filhos e netos, no mesmo palco, era uma gratificação extraordinária. Três dos que então chamávamos bando de estorninhos, começaram com seis anos e são hoje atores profissionais. Disse muitas vezes que era melhor plantar um alfobre do que comprar couves.
O teatro é ver num palco uma amostra da vida ou a própria vida; com a luz e a sombra; o delírio e a crueza; o amor e a indiferença; a esperança e a solidão; nós e os outros ou, sobretudo, o que os outros têm de nosso e nós temos dos outros. O teatro é sobretudo esta escola de estética com poesia por dentro do corpo.
Sinto hoje que, quando escrevi a Taverna, era um artesão ingénuo dos afetos e ainda hoje, por entre as penumbras do tempo, não me sinto muito diferente de mim.
E como vê, hoje, a cultura na Guarda e no interior do país?
Se me reportar há trinta e sete anos, quando vim de Coimbra, a decadência é notória ainda que com algumas flutuações. Então esta cidade fervilhava e nunca me senti órfão de Coimbra.
Assisti na Guarda a múltiplas manifestações culturais na sua mais diversa expressão. Esta dinâmica tinha o dedo e a obstinação do Américo Rodrigues. Há razões também de natureza demográfica e de modificação de hábitos.
As redes sociais não nos grudavam aos pequenos ecrãs como uma crescente clausura de alienados. Ao tempo, a desoras, com um grupo de amigos, para beber um fino no Zé da Praça ou no Caçador, era preciso ter a sorte de um lugar.
Ainda “permanece amante das palavras vadias”, como referia numa sua nota biográfica?
Permaneço, ainda que com menor densidade de momentos que há umas décadas atrás. Talvez me tornasse mais seletivo e conciso.
Normalmente escrevo por impulso e obedeço a chamamentos interiores ligados às coisas da vida (ou à vida das coisas). Isolo-me numa casa antiga, com a lareira por dentro da salamandra de inverno e com uma grande amplitude de músicas de referência a flutuar no espaço.
Depois é começar a ligar a filigrana das palavras com a delicadeza que elas merecem: são por natureza muito solidárias e atraem-se com a mesma multiplicidade de sentimentos que os humanos. Às vezes fazem-me chorar e isso significa que se agarraram a mim pela ponta dos dedos
Possui uma diversidade de contos e textos publicados em jornais e revistas. Para quando uma obra que reúna essa produção? E para quando um livro novo?
Nunca esteve nos meus horizontes a publicação. Mesmo quando saiu o “Litoral” foi um desafio teimoso do João Luís Neca, do Bando de Palmela.
Julgo ter sido o Vergílio Ferreira que um dia escreveu que mesmo aqueles que escrevem para a gaveta, estão sempre à espera que um dia lh’a abram. Eu escrevi muito para a gaveta e era a minha mulher que a arrumava e organizava. Mais tarde o meu filho disciplinou-me no computador, mas continua a ser a minha gaveta informática.
Sem falsa modéstia, é o momento em que escrevo - à mão - que me seduz e alimenta; depois, muito raramente revisito o que escrevi; tenho medo do desconsolo. Nos últimos tempos, por “encomenda” de um estorninho da Taverna, o Pedro Sousa do Acert de Tondela e dos Gambuzinos e Peobardos, tenho escrito textos para teatro, e não me desagrada a publicação oral.
Escrevia no seu livro “Litoral”: “quando regressei às origens nada de mim morreu. Vendo bem, aconteci de outra maneira”. A ligação ao seu Avó contribui para esse regresso? Que memórias guarda desses primeiros anos da sua infância?
E continuo a acontecer de outra maneira porque a vida nos chama de muitas encruzilhadas e distâncias. O regresso de Coimbra foi o fecho do triângulo. Nasci na quinta. Na Covilhã era uma criança urbana; pedia autorização para ir brincar para o Jardim com os amigos; Eu e o João éramos os acólitos da missa da tarde na igreja de São Francisco; o padre Lemos (que depois deixou de o ser) emprestou-nos, aos dois, com conhecimento dos pais, um livro sobre educação sexual para crianças; era o tempo do Vaticano II; mais tarde, pelas dezassete horas, já eu e o João tínhamos extorquido, às respetivas mães, vinte cinco tostões cada um, para jogar snooker no Ginásio Clube.
No fim de semana e nas férias lá vínhamos na camioneta do Tonico para a quinta. O meu avô era um pedagogo nato. Dotado de uma subtileza invulgar tinha o humor clarividente de Monsieur de la Palisse que denunciava a essência por detrás do óbvio. Com ele, desde muito pequeno, aprendi todos os trabalhos e ciclos rurais. Muito pequeno, saltei um dia para um cesto de uvas de mesa e comecei a pisá-las, imitando os homens no balceiro; indiferente ao meu orgulho, o meu avô passou por mim e disse à minha mãe: ó Clementina vai lá ver o Tó! E mais aqui não cabe do Homem que me ensinou a dimensão das pequenas coisas que ainda hoje preenchem a essência mais nobre do meu pensamento.
O que continua a representar para si a Vela, globalmente entendida?
A Vela era o meu lado rural e telúrico. Quando mais tarde, já na faculdade, me afundei nos livros do Torga (com quem um dia falei), tinha encontrado por inteiro o lado granítico da existência.
Os sítios do silêncio nos lilases do crepúsculo. E ainda hoje, quando olho para a Serra do Seixo, vejo o dedo gordo e indicador do meu avô a ensinar-me onde o Sol se punha no pino do verão; depois começava a pôr-se cada vez mais abaixo – dizia. Eu viria a aprender o que era um solstício; o meu avô não precisava disso para nada.
A Vela continua a ser isto: um mosaico imenso de memórias à solta e, claro os amigos com quem continuo a entusiasmar-me na liberdade livre de uma boa conversa.
O que pensa desta homenagem que lhe faz o Município da Guarda?
Ouvi um dia a Jairzinho, jogador de excelência da seleção canarinha campeã do mundo, que falar sobre nós é indigesto. O reconhecimento, não o nego, afaga a alma e dá consistência à identidade. Mas foi com muitos outros, no trilho profissional; nas aventuras culturais; na partilha mais abrangente da vida; foi com os outros que são parte de mim, que esta homenagem é parte deles.
H.S. /Correio da Guarda
“Na atualidade, a Escola é vista em termos sociais como um prolongamento da creche e por isso alguns encaram-na como “depósito dos filhos”. A preocupação com a aprendizagem mantém-se, mas com outra perspetiva”. Afirmou José Manuel Monteiro ao Correio da Guarda.
Este docente, que deixou recentemente as atividades letivas, cuja envolvência com as atividades cultuais tem sido notória ao longo dos anos, não deixa de notar que “os agentes educativos vivem um pouco alheados da cultura.”.
José Manuel Gonçalves Monteiro (1957) nasceu em Quinta dos Prados, Panóias e estudou nos Seminários da Guarda. Licenciado em Estudos Clássicos e Portugueses pela Universidade Clássica de Lisboa, foi professor nas Escolas Preparatória Gaspar Correia, Preparatória Vasco da Gama, Secundária nº1 da Venteira – todas na área metropolitana de Lisboa – secundária da Sé e Afonso de Albuquerque, na Guarda. Escreveu textos para jornais e revistas da cidade e publicou um livro de poesia em 2015, “A (im)perfeição dos dias” na editora Lua de Marfim; fez ainda a biografia de “Nuno de Montemor (Alma Brava, Meiga)”, para a Câmara Municipal da Guarda. Enquanto professor lecionou essencialmente turmas de português, mas também de Literatura Portuguesa, Latim e Clássicos da Literatura.
Como foi o seu percurso profissional?
Comecei a dar aulas, no dia 16 de março de 1981, na Escola Preparatória Gaspar Correia, na Portela de Sacavém, em Moscavide, arredores de Lisboa. Passei depois pela Escola Preparatória Vasco da Gama, também na Portela, e depois fui para a Escola Secundária nº 1 da Venteira, na Amadora. Em 1985, concorri a estágio para a Escola Secundária da Sé, na Guarda onde fiz estágio profissional e tive como orientador esse grande homem das letras guardenses, Prof. José Carreira Amarelo, e onde fiquei até ao ano letivo de 1998/99.
No ano letivo seguinte, transitei para a Escola Secundária Afonso de Albuquerque onde terminei o meu percurso profissional. Gostei de trabalhar em todas elas e aí convivi com bons profissionais da educação que me ajudaram a aperfeiçoar a “arte de ensinar”.
Como surgiu a sua vocação pelo ensino?
Tendo frequentado os seminários diocesanos, enquanto estudante, tive a sorte de ter bons professores, por isso, foi uma decisão natural.
Além disso, sempre tive uma empatia com os jovens e gostava do modo como eles procuravam aprender sempre mais. Enveredar pelo ensino foi, portanto, uma decisão que surgiu naturalmente e, quando me foi proposto começar a lidar com crianças, na Escola pública, aceitei imediatamente o desafio.
Fui trabalhador-estudante nos quatro primeiros anos de lecionação sendo difícil conciliar os estudos com as aulas, mas acabei por tomar o gosto pelo ensino e fiquei durante 43 anos seis meses e quinze dias.
E como foi a adaptação/integração nas atividades letivas?
Como acabei de referir os primeiros anos foram muito difíceis, mas a vontade de superar as dificuldades venceu tudo. Recordo que no primeiro ano tinha aulas alguns dias às 8.30 e tinha de sair de casa às 6.00 da manhã. Depois das aulas na escola, havia ainda a Universidade e, às vezes, chegava a casa após as 22.00 horas.
A integração decorreu relativamente bem já que tive bons colegas e nunca houve problemas com ninguém nas várias escolas por onde passei. A ajuda dos colegas, nos primeiros anos, foi muito importante. A formação que ia realizando também ajudou a adquirir conhecimentos no processo de ensino aprendizagem.
Relativamente aos alunos, com que idades gostou mais de trabalhar/lecionar?
Ao princípio, comecei com o 5º e 6º anos e a inocência deles e a avidez de aprender eram motivos para trabalhar com mais entusiasmo. Mais tarde, lecionei o 3º ciclo e secundário e também nessas idades via vontade de aprender.
Confesso que, nos últimos anos, só lecionei secundário e, por isso, sentia maior realização na transmissão de conhecimentos. Embora os programas fossem um pouco redutores, quer em relação ao português, quer na disciplina de Literatura, o interesse por outros autores era uma curiosidade que os levava a quererem alargar os seus conhecimentos.
Notou, ao longo dos anos, diferenças no comportamento dos alunos na aula e no interesse pelas matérias lecionadas?
Obviamente que, ao longo de 43 anos, muitas coisas mudaram em termos de ensino e de sociedade. Como referi, comecei em 1981, poucos anos após abril, e, apesar da revolução ainda estar fresca, os alunos iam para a escola motivados e gostavam de aprender.
A liberdade conquistada não impedia os alunos de respeitarem o professor dentro da sala de aula. Nesses primeiros anos tive alunos do Prior Velho, em Sacavém, e da Venteira, na Amadora, que eram zonas bastante problemáticas, mas nunca tive qualquer falta de respeito. Após a primeira década do século XXI, a desmotivação tornou-se maior entre os alunos já que os meios digitais foram paulatinamente tomando conte das mentes e a atenção em sala de aula diminuiu consideravelmente.
A seguir à pandemia esta situação tornou-se banal em sala de aula e, se não existisse uma imposição quase autoritária para deixar o telemóvel de lado, haveria sempre alguns alunos online durante todo o dia. Claro que, paralelamente ao comportamento, o desinteresse aumentou e, mesmo recorrendo a material da net ou utilizando outros meios digitais de informação, a atenção perdeu-se numa percentagem elevada.
Os professores viram aumentada a sobrecarga de trabalho ao longos dos anos e das várias reformas/alterações introduzidas? Quais as principais dificuldades?
Para ser sincero, acho que o trabalho de Professor sempre foi bastante “duro” porque, além das aulas, há sempre as atividades burocráticas que também é necessário realizar, mas que nunca me seduziram tanto como o estar na sala de aula frente aos jovens.
Essas atividades é que foram criando um esforço suplementar nos docentes pois, especialmente nestes últimos anos, lidar com Pais e Encarregados de Educação tornou-se uma tarefa difícil.
Quanto às atividades letivas, se a formação exigida foi realizada com empenho e honestidade, as dificuldades não eram tão prementes.
Pessoalmente, fui acompanhando a evolução do mundo digital quer por autoaprendizagem, quer por ações de formação realizadas e isso permitiu-me acompanhar sempre os alunos recorrendo a materiais novos que a cada ano iam surgindo.
Como viu a relação professor/aluno, ao longo dos anos?
Se a relação em sala de aula for complementada com uma relação de proximidade fora da mesma sala, acho que os problemas serão sanados com certa facilidade. Quando os pontos de vista se extremam, é que surgem os problemas. Nos meus anos de serviço, recorri à “expulsão” da sala de aula três ou quatro vezes e posso afirmar que esses alunos/as são hoje meus amigos pois perceberam que a minha atuação tinha sido justificada e educativa, não penalizadora.
Logicamente, e acho que já referi isso em questões anteriores, durante as quatro décadas a sociedade mudou e os valores que eram referenciados pela Escola mudaram muito.
Nos anos oitenta, havia um respeito temeroso na Escola e aluno e professor pertenciam a realidades diferentes. Hoje, há que criar um respeito baseado na confiança mútua e é bom que os alunos sintam que o Professor está lá como um orientador e como alguém cuja experiência lhe permite lidar com a situação de aprendizagem de maneira diferente já que tem uma cultura que o adolescente não tem. Se essa confiança se estabelecer, haverá menos problemas em contexto de sala de aula.
Que projetos ou atividades mais gostou de desenvolver?
Sempre me senti bem dentro da Escola e participei pouco em atividades extraescola, como visitas de estudo de um dia ou dois, como se faziam antigamente.
De qualquer modo sempre que havia a possibilidade de os alunos participarem quer em palestras, quer em representações teatrais ou de outra índole na cidade, fazia questão de os meus alunos estarem presentes.
Como nos últimos anos lecionei as disciplinas de Literatura Portuguesa e Clássicos da Literatura promovi conversas com escritores não só por convite pessoal, mas também em colaboração com o TMG, BMEL e Museu. Privilegiei escritores e autores da cidade ou distrito, pois normalmente são pouco conhecidos dos jovens. Lembro que as publicações de autores da Guarda, até há pouco tempo, eram quase inexistentes e não tinham visibilidade.
Quais os momentos ou acontecimentos ocorridos na sua vida profissional que lhe trazem melhores recordações? E os piores?
Foram anos de realização profissional bastante gratos. As melhores recordações que me ficaram no coração foi o reconhecimento que, em cada ano, os alunos me foram fazendo e os agradecimentos recebidos deles.
As lágrimas nos olhos, os abraços recebidos no final de cada ano letivo foram a “medalha” mais genuína que como professor pude receber.
Há uma recordação que ficará sempre na memória que foi a publicação do livrinho “Para sempre … talvez não”, realizado na disciplina de Área Escola e publicado pelo TMG, no ano letivo de 2007/2008. Foi escrito, nas aulas, por um grupo de 5 alunas, mas só foi possível a sua execução pelo apoio que a turma toda deu. O 12º C era uma turma incrível! Ia dizer que não houve momentos maus, mas já que falei na turma, na riqueza dos trabalhos realizados e na rebeldia dos jovens que não quis prejudicar cortando-lhe as asas, houve uma entidade da cidade que achou exagerada a liberdade dada aos alunos nos seus trabalhos de investigação. Assim, data desse ano a única mancha no meu currículo profissional: uma repreensão escrita que me foi dada pela Direção da Escola. Aliás essa mancha para mim foi mais um louvor, mas que custa, custa!
Acha que o trabalho e o papel dos professores têm sido desvalorizados?
Sim. A partir do “consulado” de Maria de Lurdes Rodrigues, a profissão foi bastante desvalorizada especialmente porque em vez de professores passámos a ser técnicos burocráticos. E de exercer a profissão com liberdade pedagógica, como muito bem expressou Sebastião da Gama na sua poesia, passámos a ser funcionários cansados, como se diz no poema de António Ramos Rosa. E a base dessa desvalorização é económica e política e não pedagógica. Infelizmente!
Como vê, atualmente, a relação dos professores com os pais? É diferente daquela que se verificava há décadas atrás?
Hoje, o relacionamento entre a Escola e os Pais/EE é diferente da que se verificava há anos. A preocupação maior dos Pais era que os filhos aprendessem e conseguissem superar as dificuldades.
Na atualidade, a Escola é vista em termos sociais como um prolongamento da creche e por isso alguns encaram-na como “depósito dos filhos”. A preocupação com a aprendizagem mantém-se, mas com outra perspetiva. Assim, a relação Pais / Professores tornou-se um pouco mais conflituosa já que a perspetiva como a Escola é encarada por ambas as partes é mais divergente.
As novas tecnologias trouxeram muitas transformações no processo ensino/aprendizagem?
Acho que deviam ter sido em maior número do que aquelas que se produziram. Nós, professores, não fomos capazes de acompanhar as novas tendências do processo e, por isso, ficámos algumas vezes parados no tempo (estou a generalizar obviamente).
A evolução foi muito rápida e nem sempre os Centros de Formação e as Escolas/Ministério ofereceram aos agentes educativos meios e instrumentos pedagógicos virados para as novas tecnologias. Especialmente o Ministério achou que os professores tinham obrigação de aprender sozinhos, como se isso não fosse um dever do próprio Ministério. Desta maneira, quando se deu o desenvolvimento rápido das novas tecnologias, ninguém estava preparado suficientemente para as aplicar nas escolas. Ainda hoje se nota esse desfasamento.
Como pessoa de cultura e atenta à cultura procurou sensibilizar e envolver os alunos em atividades externas desta área?
Uma das minhas preocupações, em termos de ensino, sempre foi que os alunos tivessem horizontes abertos mais além do que aquilo que a escola/programas lhes dava.
Daí que a abertura à cultura fosse um dos motivos impulsionadores da aprendizagem. Já referi atrás que procurei levar os alunos a participarem nas atividades desenvolvidas na cidade. Sempre que era possível lá estávamos ou como ouvintes, ou como intervenientes. Assim, foram várias as atividades em que participei com os meus alunos quer na BMEL, quer no TMG, quer no Museu. O livrinho, que referi acima, foi publicado pelo TMG, pois o Diretor daquela altura, Américo Rodrigues, fez todos os possíveis para que aquela atividade não ficasse apenas na escola, mas fosse divulgada à comunidade.
Lembro também, a título de exemplo, a participação dos alunos numa atividade do Museu em que foram “atores” ativos e uma outra mais recente, na BMEL, onde leram poemas na apresentação de uma poeta de Lisboa, Lília Tavares. Fica a noção de que poderia ter sido feito muito mais, mas muitas vezes os horários rígidos da Escola não permitiram uma maior presença.
Os professores são participativos nas atividades culturais, dentro e fora da escola?
Dentro da Escola tirando raras exceções os docentes participam de boa vontade nos acontecimentos programados. Nos últimos anos, o Ministério tenta implementar nos alunos o gosto pela leitura recorrendo aos Professores bibliotecários e a diversas atividades que foram bem recebidas pelo corpo docente. [No Agrupamento a que pertenço, o papel do Professor bibliotecário foi muito bem dinamizado pelos Professores Joaquim Igreja e Adelaide Mariano que desenvolveram imensas atividades procurando incentivar os alunos à leitura.]
Fora da escola, infelizmente a presença dos professores nas atividades culturais é muito escassa. Parece que os agentes educativos vivem um pouco alheados da cultura. Há, no entanto, em quase todas as atividades desenvolvidas um grupo que marca presença assídua.
Houve alunos/alunas que ficaram para sempre na sua memória? Acompanha ou procura acompanhar os seus percursos profissionais?
Sim, felizmente! Há um grupo bastante numeroso com que fui mantendo contacto. Essa relação pós-escola, traduz-se por exemplo na apresentação de livros entretanto publicados por eles.
Hoje, as redes sociais facilitam esse contacto e entre os amigos que tenho no facebook ou no instagram há um grupo muito grande de antigos alunos. Fora das redes sociais, há outros contactos que se estabelecem e que me permitem acompanhar o seu percurso profissional.
É um orgulho ver o êxito que têm nas várias áreas em que se integraram no mundo do trabalho. Claro que o contacto mais frequente é com aqueles que se tornaram professores e que sentem o que eu sentia, daí a troca de mensagens sobre o processo de aprendizagem.
A sua ligação à poesia é conhecida. Como surgiu esse gosto? Autores preferidos?
A poesia surgiu naturalmente ao longo dos anos de estudos. Um dos responsáveis por esse gosto foi o meu Professor de Português dos 10º e 11º anos, Padre António Crespo, que, nas aulas, lia poesia de maneira emotiva e expressiva. A partir daí, o gosto foi crescendo.
A princípio, li o nosso Augusto Gil todo e outros autores da época como Afonso Lopes Vieira. Depois nasceu o gosto pelos grandes poetas portugueses do século XX: Fernando Pessoa, Miguel Torga, Sophia e Eugénio. Estes são os meus poetas de referência.
Dos atuais, gosto de ler poesia de Nuno Júdice, João Barreto Guimarães, Jorge Sousa Braga, Ana Luísa Amaral, Filipa Leal, Lília Tavares e Maria Afonso. Não tanto na poesia, mas como autores de referência literária atual, leio Valter Hugo Mãe, João Tordo, José Luís Peixoto, Afonso Cruz entre outros.
E quanto à sua produção poética? O que tem feito e que projetos estão em perspetiva?
Na apresentação do meu livro de poesia, em 2015, referi que seria uma publicação única pois quis fazer com ela uma homenagem aos meus pais cujo centenário de nascimento celebrávamos. Por isso, não tenho planos de publicação em breve. Não quer dizer que não venha a acontecer daqui a uns anos.
Continuo a escrever poesia e prosa, mas para a gaveta. A escrita é uma libertação da rotina diária, mas intimista. A exposição ao público não é necessária para o ato criativo. Se vier a existir tudo bem. Assim, perspetivas de publicação nos próximos anos, não há.
Como vê a atividade cultural realizada na Guarda?
Face às verbas destinadas à cultura(s) pelo município(s), muito se consegue fazer na cidade. As prioridades vão para espetáculos de carácter populista – a cultura popular também é importante e merece ser divulgada – com música de fácil memorização. Quanto à cultura séria e que leva a pensar, os responsáveis pela programação fazem o possível por concretizar uma oferta diversificada que vai da música ao teatro e a conferências sobre assuntos importantes.
No entanto acho que se deveria fazer uma pouco mais. O referente da nossa cidade e patrono da Biblioteca, Eduardo Lourenço, pediria um pouco mais e melhor. A cidade, em tempos não muito distantes, foi uma referência cultural a nível nacional, hoje não o é. Os tempos são outros é verdade e, repito, os diretores do TMG, BMEL e MUSEU tentam trazer à cidade algum dinamismo, mas sem ovos….
Um aspeto relevante, e que me apraz destacar, tem sido a realização de atividades que impliquem as escolas e com horários em tempos de aulas. Haver atividades só ao fim de tarde e noite não atrai os jovens a participar pois têm outros interesses para esses horários. A cultura e a Escola deviam caminhar juntas de mãos dadas.
Que iniciativas, já realizadas, gostaria de sublinhar? E o que gostaria de propor?
As representações teatrais de qualidade, os espetáculos com cantores e grupos musicais de relevo, as exposições importantes que tem havido na Galeria de Arte, na BMEL e no Museu são iniciativas que merecem mais relevo citadino. No entanto, destaco as publicações de livros que têm sido feitas com autores da cidade. Muitos deles passam ao lado do grande público e seria uma pena pois temos na cidade bons escritores.
A minha proposta, para além das atividades que vão sendo feitas, era levar esses autores (escritores e artistas plásticos) às escolas para que os alunos pudessem ter um contacto mais forte com aquilo que se faz na cidade. E isso é possível sem grandes custos para a autarquia.
Quais os seus projetos, a curto prazo?
Não tenho grandes projetos delineados. Para já, viver cada dia usufruindo das coisas boas da vida. O contacto com a natureza é um dos legados dos meus pais e agora vai ser possível realizá-lo mais e melhor.
Além disso, aproveitar as oportunidades de aprender quer lendo mais, quer fazendo mais visitas a sítios ainda não visitados. Alargar e aprofundar conhecimentos e transmiti-los através da escrita. O projeto horaciano do carpe diem! continua a ser o melhor, na minha perspetiva."Ensinar é um exercício de imortalidade. De alguma forma continuamos a viver naqueles cujos olhos aprenderam a ver o mundo pela magia da nossa palavra. O professor, assim, não morre jamais." (Rubem Alves).
HS/Correio da Guarda
Até ao próximo dia 21 de novembro decorre o prazo de discussão público do Regulamento do Conselho Municipal de Cultura, período durante o qual podem ser submetidas sugestões relativamente a esse documento.
As sugestões deverão ser formuladas por escrito, dirigidas ao Presidente da Câmara Municipal da Guarda, podendo ser também enviadas por correio eletrónico, para geral@mun-guarda.pt.
No preâmbulo do regulamento é referido que “a criação do Conselho Municipal de Cultura constitui uma oportunidade de gerar reflexão, partilhada com os cidadãos e suas instituições, no sentido de juntar esforços e competências no desenho de um projeto comum em torno da Cultura, um projeto que seja mobilizador e aberto, com vocação e dimensão europeias e internacionais, realizado a partir da força das marcas identitárias do concelho da Guarda, aproveitando aquilo que é a sua matriz cultural e que constitui uma força mobilizadora no contexto nacional.”
Este Conselho tem como finalidades promover, acompanhar, analisar, debater e sustentar um processo de reflexão estratégica sobre o setor cultural, através da mobilização dos agentes culturais do concelho da Guarda; contribuir para o aprofundamento do conhecimento da situação de atividade cultural do Concelho da Guarda, através da consulta às organizações e representantes que a constituem; promover o debate sobre a programação cultural do concelho da Guarda.
Será composto pelo presidente da Câmara Municipal da Guarda (que preside), pelo Vereador em quem tenha sido delegado o Pelouro da Cultura, que assegura a substituição do Presidente, nas suas ausências e impedimentos; um representante das Juntas de Freguesia e Uniões de Freguesias, a designar pela Assembleia Municipal; um representante do Instituto Politécnico da Guarda; um representante da Diocese da Guarda; um representante de cada um dos Agrupamentos de Escolas; um representante de cada uma das Escolas Privadas; um representante das Escolas/Academias de Dança; um representante do Conservatório de Música da Guarda; um representante das Escolas de Música; um representante de cada uma das Associações Culturais do Concelho da Guarda; um representante do Museu da Guarda; um representante da Biblioteca Municipal Eduardo Lourenço; um representante do teatro municipal da Guarda e por duas pessoas de reconhecido mérito na área da cultura, a designar pelo presidente da edilidade guardense.
A Longa-Metragem Internacional Fauna realizada por Pau Faus (Espanha) é a grande vencedora do “Grande Prémio Ambiente” do CineEco 2024.
Esta obra cinematográfica, seleção oficial do festival Visions du Réel 2023 e premiada nos festivais de Toulouse e Guadalajara 2023, mostra um combate entre dois mundos, um verdejante e rural e outro que se quer estéril e tecnológico, que dependem intrinsecamente um do outro, num balanço aparentemente impossível de alcançar. Uma janela que, embora se queira selada, parece cada vez mais empurrar o mundo exterior que a encerra.
O “Prémio Curta e Média Metragem Internacional” foi entregue a Magnífica: Kutsumaton Vieras de Ville Koskinen (Finlândia), filme-documentário acerca da coexistência entre veraneantes finlandeses e um visitante inesperado de nome Pectinatella Magnifica – é alguma coisa e há grandes quantidades dela. A chegada de manchas viscosas e verdes a um meio seguro e familiar traz sensações desconfortáveis à comunidade comodista de classe média.
A Longa-Metragem em Língua Portuguesa Sem Coração de Nara Normande e Tião conquistou o “Prémio Camacho Costa”. O filme retrata o verão de 1996 na costa nordeste do Brasil, onde Tamara prepara-se para deixar a vila piscatória para estudar em Brasília. O filme integrou a seleção oficial da secção Orizzonti no Festival de Veneza 2023 e obteve o prémio de melhor filme brasileiro na Mostra de Cinema de São Paulo 2023.
O “Prémio Curta-Metragem em Língua Portuguesa” foi atribuído a Percebes, de Alexandra Ramires e Laura Gonçalves, vencedora também do Crystal Award de melhor curta no Festival de Animação de Annecy 2024. Com o mar e um Algarve urbano como pano de fundo, seguimos um ciclo completo da vida de um molusco especial chamado PERCEBES. No percurso da sua formação até ao prato, cruzamos diferentes contextos que nos permitem compreender melhor esta região e aqueles que nela habitam.
The Bio Estrela Project de Oliver Couch recebeu o “Prémio Panorama Regional”, que aborda o peso da ameaça dos incêndios florestais na destruição de uma das últimas regiões naturais de Portugal, a serra da Estrela. Se os incêndios continuarem, Portugal perderá mais do que as árvores queimadas. Perderá as gerações da história e da tradição mantidas vivas nas comunidades agrícolas e nas vilas que subsistem e vivem das florestas.
O vencedor do “Prémio Juventude Longa-Metragem Internacional”, foi o documentário Common Ground, de Joshua Tickell e Rebecca Harrell Tickell (EUA). Também premiado no Festival de Tribeca 2023, conta a história dos pioneiros da agricultura regenerativa, com participações de Jason Momoa, Laura Dern, Rosario Dawson, Donald Glover, Woody Harrelson e Ian Somerhalder.
A 30.ª edição do CineEco exibiu 64 obras cinematográficas de 27 países, selecionadas entre cerca de 1800 filmes submetidos à competição. Entre os dias 10 e 18 de outubro, passaram pelas salas do Festival mais de 3500 espetadores
Este ano, mais uma vez, houve uma série de atividades paralelas no CineEco como os Encontros no Mercado, Conversas no Jardim, a inauguração do novo espaço de exibição de filmes Videoarte, as Exposições O Estado da Água, Plastic Bitch e Line.
Segundo nota divulgada pela organização, “o festival mantém-se vivo ao longo de todo o ano e vai continuar com uma diversa rede de extensões por todo o país, em cineclubes, associações, teatros, universidades e auditórios, proporcionando ao público filmes desta temática, constituindo-se como um dos muitos fatores diferenciadores do festival.”
Recorde-se que o CineEco – Festival Internacional de Cinema Ambiental da Serra da Estrela é um dos festivais de cinema de ambiente mais antigos do mundo, que se realiza em Seia, anualmente em outubro e de forma ininterrupta, desde 1995, por iniciativa do Município de Seia.
“O CineEco oferece ao público em geral um cinema de qualidade e cinematografias pouco conhecidas e alternativas em relação ao mercado tradicional. Em todas as edições e em todas as secções ou atividades a entrada é gratuita, prestando um serviço público.”
Como foi sublinhado pela organização, “através das experiências multiculturais, o CineEco ajuda a descrever e compor um panorama do pensamento mundial atual sobre estas questões e proporciona aos espetadores momentos de conhecimento e reflexão, com a ambição de gerar comportamentos transformadores e de participação, contribuindo para uma cidadania ativa no domínio do desenvolvimento sustentável e valorização do território e enriquecimento do conhecimento ambiental e cinematográfico.”
O festival é organizado pelo Município de Seia e conta com o Alto Patrocínio do Presidente da República e do Departamento de Ambiente das Nações Unidas.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.