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Fundadora da Associação da Propaganda Feminina, Carolina Beatriz Ângelo foi a primeira mulher a exercer, em Portugal, o direito de voto, posicionando-se também num lugar de destaque no quadro europeu, ao nível da intervenção cívica.
Nascida na Guarda, a 20 de Maio de 1877, aqui frequentou o Liceu, a partir de 1891, antes de rumar para Lisboa onde estudou na Escola Politécnica e, dois anos depois, na Escola Médico-Cirúrgica, concluindo o curso de Medicina em 1902. Nesse mesmo ano casou com o médico Januário Barreto, natural de Aldeia do Souto (Covilhã).
Carolina Beatriz Ângelo, para além do facto que a tem envolvido em singularidade e distinção, é conhecida igualmente por ter sido a primeira mulher portuguesa a desenvolver actividade cirúrgica, no Hospital de São José, em Lisboa; naquela cidade teve consultório na Rua do Almada.
Tendo abraçado desde cedo a causa feminista, onde pontuaram nomes como Maria do Carmo Lopes, Adelaide Cabete, Ana de Castro Osório e Domitila de Carvalho, entre outras, Carolina Ângelo viria a aderir à Maçonaria; fundadora, e elemento activo, da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas afastou-se, por divergência de princípios com outras dirigentes, e empenhou-se na criação da Associação de Propaganda Feminista, a que, aliás, presidiu.
Foi um período de grande envolvimento na reivindicação do sufrágio feminino e na exigência do reconhecimento dos direitos das mulheres. Em 1911, no mês de Fevereiro, subscreve, juntamente com outras destacadas figuras feministas, um documento – entregue a Teófilo Braga – em que solicita o direito de voto para a mulher, com reconhecida independência económica. Recorde-se que a primeira lei eleitoral da República Portuguesa condicionava o direito de voto aos cidadãos “com mais de 21 anos, que soubessem ler e escrever e fossem chefes de família”.
Em Tribunal argumentou, em favor do exercício do seu direito de voto, com o facto de ser viúva (o marido falecera em Junho de 1910) e “chefe de família”. Em 28 de Abril de 1911, o juiz João Baptista de Castro, considerando que excluir a mulher “é simplesmente absurdo e iníquo e em oposição com as próprias ideias da democracia e da justiça proclamada pelo partido republicano”, sentenciou que “a reclamante seja incluída no recenseamento eleitoral em preparação no lugar e com os requisitos precisos”.
Nesse mesmo ano, a 28 de Maio, e nas eleições para a Assembleia Constituinte, protagonizou o primeiro voto por parte da mulher portuguesa; acto que teve lugar na assembleia eleitoral de S. Jorge de Arroios (Lisboa).
Quando do seu papel de liderança e da sua combatividade em prol dos ideais feministas e republicanos muito havia a esperar, a notícia da morte – a 3 de Outubro de 1911 – de Carolina Ângelo colheu de surpresa mais diversos meios políticos, intelectuais e sociais.
Como escreveu Antonieta Garcia, no seu excelente trabalho “Carolina Beatriz Ângelo – Guarda(Dora) da Liberdade”, a médica guardense “na luta pelo direito ao sufrágio, pela educação feminina, pela emancipação, ergueu a voz, envolveu-se na regeneração do país, na utopia republicana”. Afirmando-se como “mulher de um tempo em devir, moderna, audaz, com talento, com coragem, sabedoria, intuiu que o feminismo não podia ter pressa mas, tacitamente, interveio cultural e politicamente nas res publica, abraçando a causa da igualdade entre os géneros”.
Pioneira do sufrágio feminino, em Portugal, o nome de Carolina Beatriz Ângelo faz parte da toponímia da Guarda e de outros centros urbanos, como Lisboa, Porto, Tavira ou Almada, e foi atribuído também à unidade hospitalar de Loures/Odivelas. A Guarda, contudo, é indissociável desta personalidade que “internacionalizou o feminismo português”.
A toponímia guardense tem registado (há cerca de duas décadas) o seu nome numa das ruas da zona outrora pertencente à Quinta do Pinheiro. (H.Sequeira)
Guarda. No alto da cidade.
Os Festivais de Cultura Popular do concelho da Guarda vão decorrer este ano, embora em moldes diferentes das edições anteriores.
Os programas dos Festivais, implementados através das juntas de freguesia e associações locais, deverão decorrer online com algumas iniciativas presenciais.
Estão previstos documentários sobre as edições anteriores e também percursos na Natureza, e ateliês de artes& ofícios.
O primeiro é já no dia 4 de junho com a Feira/Concurso do Jarmelo (que continua a 6 de junho) e seguem-se-lhe a 12 de junho, as Jornadas da Lã – Festa da Natureza, em Corujeira e Trinta; a 11 de julho, o Festival de Cestaria de Gonçalo – Cultura e Arte; a 24 de julho, Festival Pão Nosso – Festa da Natureza, em Videmonte; a 29 de agosto, “Viagem às Raízes”, em Arrifana; e 6 e 7 de novembro, Festa da Castanha e da Jeropiga, em Famalicão da Serra.
As obras realizadas no ano passado, no âmbito da iniciativa “Terra D´Artes”, onde foram convidados artistas nacionais para interpretarem os festivais de cultura popular, serão este ano entregues à organização de cada festival, e as peças serão expostas no seu “habitat natural”.
O objetivo deste ciclo de Festivais passa pela preservação dos valores e recursos culturais e naturais que diferenciam este território, potenciando um olhar atento pela região e homenageando um legado único de um valor inestimável. Da raça autóctone Jarmelista, no Jarmelo, passando pela lã da Corujeira e Trinta, pelo pão de Videmonte, pela cestaria de Gonçalo, a transumância em Fernão Joanes e a pela Castanha em Famalicão.
Fonte: CMG
No próximo dia 30 de maio vai decorrer em Fernão Joanes (Guarda) uma prova integrada no Campeonato Europeu e Nacional de Motocross.
António Bico, Presidente da Associação Cultural e Recreativa de Fernão Joanes, disse ao CORREIO DA GUARDA que organizar "um evento desta dimensão é sempre algo bastante complexo e que requer um grande exercício burocrático. Este ano, devido à atual situação pandémica, o desafio torna-se ainda maior”.
Como surgiu o projeto de criar condições, em Fernão Joanes, para a realização de provas de Motocross?
Enquanto associação, sempre acreditámos que Fernão Joanes era um local único, com muito para oferecer, e vimos neste evento a oportunidade de lhe dar uma nova vida, de o rejuvenescer.
O espírito do motocross foi algo sempre presente em Fernão Joanes, desde há cerca de 20 anos quando ainda só se realizavam provas amadoras, e então decidimos aproveitar essas raízes para investir num crossódromo e concorrer para que uma das etapas do campeonato se realizasse nesta aldeia beirã. Felizmente conseguimos, e é algo que nos deixa cada vez mais felizes a cada ano que passa.
Acha que Fernão Joanes tem características diferenciadoras para afirmar as suas pistas face a outras congéneres, dentro e fora do país?
Sim, totalmente. Além do Crossódromo Internacional das Lajes possuir todas as infraestruturas consideradas necessárias para organizar qualquer tipo de evento desta modalidade, o facto de estar situado em pleno Parque Natural da Serra da Estrela, faz com que possua características muito próprias e diferenciadoras, dando-lhe um traçado muito técnico e competitivo.
Considera que a projeção dada a esta localidade, através do Motocross, ultrapassou as expetativas iniciais?
Inicialmente, quando decidimos dar este passo no sentido de profissionalizar a cultura do motocross na região, não tínhamos noção do real impacto que isso teria na nossa aldeia.
Contudo, sentimos que a organização deste evento foi algo que começou a unir cada vez mais as pessoas da aldeia, que todos os anos se voluntariam para ajudar em todas as tarefas necessárias. Além disso, o número de visitantes tem sido também crescente, o que impulsionou o desenvolvimento e aparecimento de novos negócios em Fernão Joanes para acolher o campeonato e os turistas que começam a escolher a aldeia para umas férias descansadas com família ou amigos.
É certo que não esperávamos que tivesse um impacto tão positivo, mas ficamos imensamente gratos e felizes por assim o ser.
No atual contexto de emergência sanitária, provocada pelo Covid 19, acha que a realização de mais uma importante prova, integrada no Campeonato Europeu e Nacional de Motocross, assume um desafio diferente e acrescidas dificuldades?
Sim, sem dúvida. Organizar um evento desta dimensão é sempre algo bastante complexo e que requer um grande exercício burocrático. Este ano, devido à atual situação pandémica, o desafio torna-se ainda maior, no sentido em que nos obriga a adotar um conjunto de medidas, ações logísticas e organizacionais que num ano "normal" não seriam necessárias.
Vai haver medidas especiais para os participantes nas provas e para o público?
A pandemia obrigou-nos a alterar toda a logística habitual da organização do evento para garantir que os participantes têm todas as condições para realizar a competição em segurança.
Por outro lado, e ainda que o evento seja realizado ao ar livre, de forma a evitar a concentração de pessoas, a competição decorrerá ainda sem a presença de público.
Está pensada a transmissão através de plataformas digitais para viabilizar o acompanhamento do desenrolar destas provas por parte de um maior número de pessoas.
Sim, o evento poderá ser acompanhado através do Canal Youtube da Federação de Motociclismo de Portugal e será gravado com câmaras estrategicamente posicionadas para que os espectadores tenham a melhor experiência possível a partir do conforto e segurança das suas casas.
Como vê o impacto económico de uma prova desta natureza em Fernão Joanes e o seu contributo para a dinamização do tecido comercial e da atividade turística?
Fernão Joanes adaptou-se às circunstâncias e todos os habitantes e pequenos comerciantes acolheram este evento da melhor forma possível.
O campeonato é, sem dúvida, uma grande ajuda para o desenvolvimento do setor do turismo uma vez que, sendo uma prova com reconhecimento a nível europeu, ajuda a dinamizar a região ao trazer participantes, interessados e fãs da modalidade à região.
Natural de Pinhel, Abel Virgílio viveu vários anos na Guarda, cidade que considera “com forte apego, ao longo dos séculos, ao nobre sentimento da nossa portugalidade”. A vida militar, o jornalismo e a rádio são páginas de uma vida plenamente assumida, onde a sua atividade principal e vocacional – como disse ao CORREIO DA GUARDA – foi sempre o ensino. Lecionou alunos dos vários graus de ensino desde, 1963 até 1978, ano em que passou a exercer funções pedagógico-administrativas na coordenação do ensino da Embaixada de Portugal em França. Ingressou em 1989 na Inspeção-Geral da Educação, onde manteve, até à sua aposentação, “uma atividade inspetiva a escolas e instituições públicas e privadas de todos os graus do ensino.”
O que representa para si a Guarda?
A Guarda representa no meu espírito e na minha cultura uma cidade do interior do país com vasta história e imenso património artístico, no qual se salienta o seu ex-libris: a sé catedral, cabeça duma diocese multisecular.
Foi e é uma cidade altaneira, de montanha, granítica, com uma grande identidade das suas gentes e daqueles, como eu, que por lá viveram, na defesa dos seus valores e património ancestrais e na sua divulgação na diáspora, no estrangeiro.
Foi e é uma cidade, - honra lhe seja, - com forte apego, ao longo dos séculos, ao nobre sentimento da nossa portugalidade, mesmo se situada às portas de Castela-Leão.
Foi e é uma cidade da simbiose afetiva perfeita entre a sua academia, os militares do seu aquartelamento, os seus clérigos, as suas forças vivas, o seu bom povo.
Enfim, a Guarda deixou em nós todos uma forte ligação e empatia, porque nela vivemos respirando um espírito de tolerância, hospitalidade e compreensão.
Foi uma cidade inesquecível no meu itinerário de vida: lá namorei, lá casei, lá nasceram os meus dois filhos e lá estão sepultados os meus sogros.
Quando é que veio para a Guarda?
A primeira vez que subi à Guarda, ido da minha terra natal (Pinhel), foi no distante ano de 1954 para, no Liceu, prestar provas do exame de admissão. Recordo que fiquei alojado numa casa da rua dos Cavaleiros, ali bem perto da Sé e do Liceu, e pude deslumbrar-me com a imponência dos dois.
A partir dali passei a ir bastas vezes à Guarda, mas fixei-me em agosto de 1961, iniciando a preparação para o acesso à Escola do Magistério Primário, uma das mais conceituadas do país, que frequentei até finais de julho de 1963.
Mais tarde, em julho de 1967, regressei como oficial miliciano instalando-me no Regimento de Infantaria 12 onde permaneci até abril de 1970. Neste ano casei com uma guardense e por lá continuámos até ao início de novembro de 1975.
Como carateriza a cidade e a juventude dessa época?
Nesses tempos, a Guarda era o farol cultural das Beiras: tinha um ensino liceal público completo, uma escola do magistério muito prestigiada, uma escola comercial e industrial com cursos diversificados, um seminário maior com bastantes seminaristas e dois colégios católicos (um masculino e um feminino).
Neste âmbito rivalizava com as cidades vizinhas (a Covilhã, por exemplo, só possuía cinco anos do ensino público liceal).
Nesse tempo, a juventude da Guarda, saída de meios familiares relativamente pobres, era feliz e idealizava sonhos e realizava projetos para o futuro. Mas, a marca fundamental que ficou em nós todos foi a da amizade, da fraternidade e da solidariedade que nos continua a ligar ao longo da vida, decorridos já tantos anos.
O que tinha, então, a Guarda para oferecer aos jovens?
A Guarda oferecia aos jovens uma hospitalidade invulgar. As casas/pensões que nos acolhiam tratavam-nos como sendo da família. Num dos anos letivos eu estive alojado, no chamado largo João de Deus ou dos Correios, na casa da D. Cândida Mota (onde também esteve o antigo procurador-geral Pinto Monteiro e outros) e no seguinte, ao lado, na casa dos pais do saudoso companheiro Pedro Evangelista. Mas, fosse nos cafés, que nos tiravam do frio nas noites de inverno, fosse nas sessões do cine-teatro, fosse nas ruas geladas da cidade, tínhamos sempre o sorriso generoso e bom dos guardenses com uma saudação amiga para a “estudantada”.
Além disso, a academia da Guarda, com o uso coimbrão da capa e batina, tinha a particularidade de “oferecer” os seus caloiros uma praxe, ritual que os praxados não esqueceram nunca mais.
Ah! O que também a Guarda oferecia aos jovens eram a neve, o sincelo e o vento cieiro nos dias do inverno, imagens de marca de um tempo que nunca esqueci.
Quais as personalidades mais marcantes dessa época?
Nessa época a Guarda beneficiava do facto de ter em Lisboa, personalidades bairristas de relevo: o dr. João de Almeida, o dr. Soares da Fonseca, o professor dr. Veiga Simão (que viria a ser ministro da Educação no consulado de Marcelo Caetano), o dr. Augusto César de Carvalho, Prof. Dr. Fernando Carvalho Rodrigues e muitos mais.
Mas na Guarda, no meu tempo, as figuras mais marcantes eram os bispos da diocese, os governadores civis, os presidentes do Município, os professores dos estabelecimentos de ensino e os altos quadros do regimento, da medicina, da justiça, da indústria e dos serviços públicos.
Não poderei deixar de mencionar os bispos dos meus tempos da Guarda: D. Domingos Gonçalves, D. Policarpo da Costa Vaz, e mais recentemente essa eminente figura da igreja, o cardeal Saraiva Martins. E oradores sagrados de grande renome e prestígio, tais como o dr. Vitor Feytor Pinto e Afonso Sanches de Carvalho. Como governadores civis recordo os drs. Augusto César de Carvalho, Santos Júnior, Luis de Almeida, Mário Bento e Andrade Pereira. Como autarcas os drs. Lopes Quadrado e Aristides Prata. Como militares comandantes do R.I.12 os coronéis José Maria Vieira Abrunhosa, Jorge Inglês P. de Carvalho e Jorge Pereira de Carvalho. Como causídicos os drs. João Gomes, Francisco Bigote, Celínio Antunes, Andrade Pereira, Pires da Fonseca. Como médicos os drs. Martins Queirós, Silvano Marques, António Júlio, Alberto Garcia, Sardo, Martins das Neves, Pereira da Silva, Afonso Paiva, Orlindo Teles, Baeta de Campos, etc. Os professores que impulsionaram a nossa juventude para a vida ativa, e que se distinguiram até a nível nacional, tais como os drs. Abílio Bonito Perfeito, Costa Ramalho, Manuel Jorge Proença, Armando Saraiva de Melo, cónego Álvaro Quintalo, Beatriz Salvador, Maria Alice Quintela, Fernanda Cardinal, etc. etc. No tecido empresarial surgiam à cabeça Manuel Conde, a família Tavares, Lúcio Romão, e outros.
Como começou a sua ligação à imprensa regional e nacional? E que tipo de colaboração desenvolveu?
A minha ligação à imprensa regional iniciou-se em 1959, com apenas 15 anos.
Ao verificar que o campo de futebol municipal Astolfo da Costa, em Pinhel, servia simultaneamente para o desporto local e para a realização de feiras de gado, insurgi-me com tal atropelo sanitário e escrevi um artigo crítico que entreguei ao meu saudoso amigo Madeira Grilo, que então era, conjuntamente com Virgílio Afonso, um dos chefes da redação do semanário “Correio da Beira”.
O artigo foi publicado, e no seguimento dele tive o convite desses dois amigos para ser o correspondente do Jornal em Pinhel. Simultaneamente, também o abade de Pinhel, diretor do “Pinhel Falcão” me convidou para ser colunista neste mensário católico da cidade.
Mais tarde, em 1967, passei a ser correspondente em Pinhel do “Diário de Coimbra” e, depois, na Guarda do “Jornal de Notícias”. Pela mão do cónego Sanches de Carvalho passei a ser, além do correspondente do Jornal “A Guarda” em Pinhel, também seu editor da página desportiva e revisor de todo o Jornal antes de ser impresso. Logo que passei a colaborar no Jornal “A Guarda” abandonei a correspondência com o “Correio da Beira”.
Durante o serviço militar no R.I.12 recriei e editei o jornal regimental chamado “Fronteiros da Beira”. Mantive a colaboração com a imprensa escrita até à minha partida para França, em finais de 1975. Depois do meu regresso, em 1989, apenas continuei como colunista permanente no jornal “Pinhel Falcão”, publicando sob o pseudónimo de Eneida Beirão, até pouco depois do falecimento em 2015, do meu saudoso amigo e seu diretor Maia Caetano.
E a ligação à Rádio e quais os companheiros que recorda?
Em 1967, quando cheguei ao quartel da Guarda, fui convidado pelo meu amigo Emílio Aragonez para com ele editar na Rádio Altitude um programa desportivo designado “Desporto Regional”, logo após a saída do programa dos saudosos amigos Madeira Grilo, Luís Coito e Luís Coutinho.
Acompanhávamos o desporto regional nos três distritos da Beira interior, mas com maior incidência no da Guarda. Dessa participação benévola mas dedicada recordo com imensa saudade o nosso diretor, dr. Martins Queirós, o nosso administrador A. Carvalhinho, e os companheiros inesquecíveis nessa genuína escola da rádio e alfobre de amizades: Antunes Ferreira, Vaz Júnior, Joaquim Pinheiro, Emílio Aragonez, António José Teixeira (atual diretor de informação da RTP), Joaquim Fonseca, Luís Coutinho, Luís Coito, Alcina Coito, Madeira Grilo, Lopes Craveiro, Helder Sequeira, Virgílio Ardérius, Maria José Trabulo, Fernando Bento, Vítor Santos, Luís Celínio, Rebelo de Oliveira, Francisco Carvalho, e tantos mais que contribuíram como uma família radialista para a dignificação, expansão e prestígio da mais antiga radio portuguesa. Alguns, infelizmente, já nos deixaram.
Além de inúmeras reportagens de exteriores de índole regionalista, política, social, cultural e religiosa que assegurei para a Rádio Altitude, também criei e dirigi, com os meus camaradas João Trabulo e Joaquim Fonseca, um programa semanal do Regimento militar “A voz do Doze”.
Tem na memória algum episódio, na Rádio, que gostasse de recordar?
Poderia aqui evocar os mais diversos episódios ocorridos nas transmissões que assegurávamos de vários pontos da região e do país, nuns tempos em que o sinal era levado aos estúdios através dos imponderáveis das linhas telefónicas dos CTT. Mas os episódios que me marcaram foram os relatos de futebol transmitidos a partir dos estádios de cidades como Portalegre, Castelo Branco, Covilhã, Viseu, Coimbra, Figueira da Foz, Gouveia, Seia, Lamego, Pinhel, Aveiro, Espinho, etc., etc.
Recordo que, quando fazíamos os relatos de futebol junto aos relvados dos estádios de algumas destas localidades, os espetadores da bola, que não sabiam como se faziam os relatos desportivos, cercavam-nos estupefactos e surpreendidos durante toda a emissão.
Também guardo memória das gravações que se faziam nas sedes dos concelhos, na época que antecedia o Natal, para se registarem as mensagens dos familiares dos militares que nesse tempo combatiam nas antigas colónias. Guardo a imagem de tanta gente anónima sénior que, de lágrimas nos olhos e saudades no coração, deixava no final das mensagens sempre a esperança num sentido “até ao teu regresso!”
E as memórias sobre o R.I.12? A cidade perdeu muito com a extinção dessa unidade militar?
Tive o orgulho patriótico de durante cerca de três anos prestar serviço como oficial miliciano no velho R.I.12, aquartelado na Guarda. Apelido-o de “velho” porquanto foi descendente do terço de Chaves (1706) e herdeiro das tradições militares de unidades de grande prestígio no nosso país, por ações de resistência às invasões napoleónicas dos exércitos franceses no início do séc. XIX e por campanhas em África, na II guerra mundial e, depois, na guerra colonial.
O cumprimento do meu serviço militar obrigatório no R.I. 12 deixou-me algumas boas memórias, mormente na camaradagem e na amizade que construímos sob o lema do regimento “Firmes como rochas”.
A extinção da unidade militar deixou um vazio social e económico na cidade. Lembremos que o R.I. 12 proporcionava quatro turnos anuais de formação aos recrutas, e cada turno absorvia mais de 600 recrutas, provenientes na sua maioria da região norte do país.
Além desses, o pessoal do quadro permanente e milicianos somavam cerca de cem militares. Portanto, é fácil inferir o vultuoso investimento que a logística da unidade militar fazia no tecido empresarial da cidade e região, bem como os gastos que todos os militares, sem exceção, deixavam na habitação, no comércio e nos serviços locais.
Acha que falta fazer a história do R.I.12?
Seria importante escrever em pormenor a história do R.I. 12, e, sobretudo, a história dos regimentos aquartelados na Guarda ao longo dos tempos: R. I. 34 e 2º Grupo de Metralhadoras (1911-26), Batalhão de Caçadores 7 (1814-16, depois 1939-61), Batalhão de Caçadores 29 (1840-42), Batalhão de Caçadores 4 (1842-43), Batalhão de Caçadores 1 (1844), e, finalmente o R.I. 12 (1846-1939 e, depois, de 1966 até à sua extinção.
Durante parte do tempo em que servi no R.I. 12, por decisão do então comandante coronel Jorge Inglês, fui incumbido de escrever dois opúsculos intitulados “Pequena história dum velho Regimento – O R.I.12” e “Relação dos comandantes efetivos do R.I. 12 (1706-1967)”. A pequena história resume sucintamente as unidades que precederam o R.I. 12, as suas origens, divisas e condecorações.
Qual foi o percurso da sua atividade profissional e o que gostou mais de fazer?
A minha atividade principal e vocacional foi sempre o ensino. Lecionei alunos dos vários graus de ensino desde 1963 até 1978.
A partir desse ano letivo passei a exercer funções pedagógico-administrativas na coordenação do ensino da Embaixada de Portugal em França, sob a tutela do Ministério da Educação e da conselheira cultural da Embaixada, em Paris.
Entre 1978 e 1989, no exercício dessas funções, percorri todo o território francês para diligenciar junto das várias Academias a criação de cursos de língua e cultura portuguesa.
Em 1989, quando regressei a Portugal, ficaram em França cerca de 550 professores a lecionar Português para mais de 55 mil alunos em escolas de toda a França.
No ano letivo de 1989/90 ingressei na Inspeção-Geral da Educação, onde mantive, até à minha aposentação, uma atividade inspetiva a escolas e instituições públicas e privadas de todos os graus do ensino.
Senti-me realizado no desempenho de todas as tarefas que envolveram alunos e colegas professores e inspetores, mas um dos momentos altos da minha carreira profissional ocorreu no dia de Portugal de 1981 quando me foi atribuída pelo presidente Ramalho Eanes, sob proposta do ministro da Educação Vítor Crespo, a condecoração do grau de oficial da instrução pública.
Acompanha o que se passa atualmente na Guarda?
Sim. Pelas razões atrás aduzidas acompanho à distância as atividades e eventos da Guarda através da comunicação social e dos relatos e comentários de familiares e amigos residentes.
Como vê o estado atual da cidade?
Da Guarda da minha meninice e juventude até à atual cidade há um progresso enorme.
As auto estradas A 23, A 25 e IP2 desencravaram a região e ligaram-na mais facilmente ao litoral e aos grandes centros. A ferrovia, com as duas linhas (da Beira Alta e Baixa) em funcionamento pleno podem, no futuro, abrir mais perspetivas de desenvolvimento na Beira interior.
O Instituto Politécnico (que não existia no meu tempo) veio ser a locomotiva que fazia falta à juventude, tanto nacional como estrangeira, para sonhar e realizar projetos de vida e de futuro. O crescente número de alunos estrangeiros que procuram o I.P.G. para prosseguimento dos estudos revela bem o prestígio dos seus cursos superiores.
O turismo também é a mola impulsionadora da região serrana e mais será quando, além dos seus magníficos ares, dos seus monumentos e gastronomia, a Guarda lhes oferecer belas praias fluviais e passadiços na montanha. Na minha ótica, o porto seco na Guarda alavancará no futuro a indústria, o comércio e os transportes. Tudo isto é bom para melhorar o estado atual da Guarda.
E a candidatura da Guarda a capital europeia da cultura em 2027?
Aplaudo entusiasticamente a candidatura da Guarda a capital europeia da cultura 2027. Formulo votos para que a comissão, os municípios da região envolvidos, a comunicação social e as forças vivas trabalhem unidas nesse objetivo, que a ser conseguido, levará a Guarda para um patamar futuro de desenvolvimento e de imagem externa importantíssimos e duradoiros. Força Guarda!
Guarda. Rua D. Sancho I
Vasco Pires nasceu em Marialva (Meda) tendo passado a infância e juventude em Coimbra, onde os pais fixaram residência. Na Guarda reside há vários anos e nesta cidade desenvolve a sua atividade profissional como Técnico de Prótese Dentária.
O gosto pela fotografia surgiu em Coimbra durante o ensino secundário, altura em que desenvolveu destacada atividade no Núcleo de Fotografia e Cinema da Escola Secundária Avelar Brotero.
Não sendo o seu “modo de vida”, a fotografia, a par de outras atividades ao ar livre, assume particular importância na ocupação dos seus tempos livres. É nos temas Natureza e Paisagem que se sente mais à vontade, não deixando ainda assim de explorar outras vertentes da fotografia.
Membro fundador do “Fotoclube da Guarda”, espaço de partilha de experiências, conhecimento e divulgação, bem como de convívio entre os seus pares, Vasco Pires conversa hoje com o “Correio da Guarda”.
Como nos referiu, no seu horizonte está o projeto de desenvolver “um trabalho fotográfico que tenha em atenção as fortalezas amuralhadas da Beira Interior, sobretudo na zona raiana”.
Quando surgiu interesse pela fotografia?
O interesse pela fotografia resulta do desenvolvimento de atividades extra -curriculares durante o período escolar, concretamente no decorrer do ensino secundário; tem por base a curiosidade sobre todo o processo de criação de uma imagem, desde a câmara até à sua impressão.
Que géneros de fotos prefere? Fotografia de rua, paisagem, retrato…?
A fotografia no seu todo não deixa de me despertar interesse, no entanto a “viagem”, a “natureza” e a “paisagem” são áreas de tendência natural.
Fotografia a cores ou a preto e branco?
Não tenho uma preferência especial pela cor ou preto e branco, mas procuro adequar questão estética no ato de fazer a fotografia.
Preocupa-se com o trabalho de edição das fotografias? É um trabalho moroso?
Embora procure não perder muito tempo com a edição, quer seja no processo analógico ou digital, a pós-produção é fundamental no trabalho fotográfico.
Ainda assim entendo que a fotografia deve refletir verdade.
A zona da Guarda é a preferida para os seus trabalhos? Que outras zonas em especial?
Sendo o local onde resido, de forma natural a Guarda é o meu "quintal". Sempre que possível a câmara fotográfica é companhia nas minhas deslocações.
O que gosta mais de fotografar na Guarda?
A região da Guarda tem um vasto património natural, histórico e arquitetónico.
São motivos mais do que suficientes para o olhar da lente.
Como têm reagido as pessoas à suas fotos?
Quando mostro uma fotografia, faço-o por entender que esta reflete a minha abordagem perante um determinado motivo.
De uma forma geral as pessoas reagem de forma simpática.
O digital incrementou, junto das pessoas em geral, o gosto pela fotografia?
O digital massificou o ato de tirar fotografias de uma forma diretamente proporcional à quantidade de dispositivos que levamos nos bolsos. Também por maioria de razão, e pela simplicidade que o digital permite, o gosto pela fotografia tenha assim um estímulo maior.
Fazer fotografia implica uma permanente atualização dos equipamentos?
Não vale a pena bater na tecla de que o "antes é que era bom", pois se efetivamente é possível fazer boas fotografias com equipamentos antigos, a evolução do material fotográfico permite-nos uma utilização cada vez mais otimizada desses mesmos equipamentos.
Os preços dos equipamentos são hoje mais acessíveis?
Sem dúvida. Hoje em dia há equipamentos com uma relação preço-qualidade bem mais interessante do que há uns anos atrás; no entanto o preço a pagar por eles depende da nossa disponibilidade financeira.
Para além das iniciativas que tem havido, na área de fotografia, o que podia ser ainda feito para aproximar o público, em geral, dos trabalhos fotográficos aqui produzidos?
A divulgação das iniciativas e a sua credibilidade através de conteúdos de qualidade reconhecida são condição para a adesão do público.
Depois não desistir dessas mesmas iniciativas e sempre que possível inovar e acrescentar valor, para que os eventos passem a fazer parte de uma agenda local.
Tem algum episódio curioso, ou que lhe tenha deixado boas recordações, no decorrer da sua atividade fotográfica?
Durante mais uma jornada de fotografias à “passarada”, com o Eduardo Flor, a Ria de Aveiro tinha-se mostrado pouco generosa quanto ao número aves avistadas naquela tarde.
Algum tempo de espera num abrigo de observação, não tinha resultado numa única fotografia. Já de carro no regresso, e quando discutíamos sobre a identificação de uma "Rapina" que afinal seria um "Cuco", o Eduardo de sobressalto grita baixinho: - “Pára, para, para”... e eu parei... “Não desligues o carro” ... e eu não desliguei... “Estão duas águias no telhado daquela casa, deixa-te ficar que vou tentar fotografá-las ”...
E eu ajeitei os óculos, olhei para o telhado e fiquei ... Lá vai o Eduardo, carregado com a câmara e correspondente super teleobjectiva. Pé ante pé, qual predador no ataque à sua presa, atravessa o caminho de terra-batida e numa posição quase de cócoras percorre todo o muro que circunda a casa. Já junto ao portão ergueu-se, aponta a câmara para o telhado, foca, aproxima o zoom e alguns segundos depois, baixa a câmara e abre os braços em sinal de total desalento ...
Eu até já tinha visto duas estatuetas em forma de aguia, que serviam de adorno ao telhado da casa (risos…).
E episódio menos agradável?
Não tenciono guardar más recordações no que à fotografia diz respeito.
Que projetos tem no campo da fotografia?
Sendo um mero entusiasta da fotografia não me movo por projetos muito elaborados; no entanto está no meu horizonte desenvolver um trabalho fotográfico que tenha em atenção as fortalezas amuralhadas da Beira Interior, sobretudo na zona raiana.
A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.